Fidelidade
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Fidelidade (<latim fidelitate) é o atributo ou a qualidade de quem ou do que é fiel (<latim fide ou fido), para significar quem ou o que conserva, "mantém", preserva mesmo as suas características originais, pode-se dizer quem ou o que mantém-se fiel à referência.
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[editar] Concepções
Assim esclarecido, nota-se, de imediato, que a idéia de fidelidade, conquanto tenha raízes históricas na sua conotação religiosa (atualmente ainda válida), não se lhe prende mais exclusivamente. Ganhou foros de autonomia, para aplicar-se quer a pessoas quer a outros entes, animados, inanimados, concretos, abstratos ou mesmo imaginários, desde que observado o seu núcleo de significação, o ser ou permanecer conforme as características originais. Nessa acepção, pode-se dizer que mostra similitude com a idéia de invariância, embora não sejam necessariamente o mesmo conceito. Conservar quer dizer manter, preservar, por seu turno, quer dizer prevenir para que não haja alteração.
[editar] Fidelidade tecnológica
Fidelidade também quer dizer, na era tecnológica e das comunicações eletrônicas, algo como pureza, mas fique bem claro não se tratar de pureza espiritual ou semelhante coisa. Assim é que se fala em aparelho de som de alta fidelidade (HiFi = High Fidelity) querendo significar aquele que produz ou reproduz um som puro, no sentido de tão igual ou semelhante ao original quanto possível. De modo semelhante, diz-se de imagem de alta fidelidade, bem como de alta definição, no domínio da vídeocomunicação. Já na seara da informática, fala-se ora em fidelidade, ora em integridade de dados/informações. Todas as idéias nesse contexto guardam íntima conexão de pureza no sentido de perfeição, ou, ainda, de conformidade com o original.
[editar] Conexão originária
Como quer que seja, percebe-se que todas as acepções, todas as conotações ligam-se entre si por um vínculo comum, o da conformidade com um modelo ou uma situação original. Nesse sentido, "não há" conexão necessária entre o significado de fidelidade e a sua — sem dúvida legitima — conotação conjugal/convivencial/sexual, embora seja freqüente essa primeira inferência presumida ao se falar do assunto.
[editar] Fidelidade conjugal
Sem dúvida, existe um equívoco generalizado no identificar fidelidade com sexualidade. Há pessoas, no domínio convivencial marital ou similar, que convivem e mantém certo tipo de acordo, no qual conveniências mútuas e mútuos interesses, até mesmo acomodação, comodismo ou medo de solidão, estão em jogo — sem que haja qualquer "contrato" de fidelidade, expresso ou tácito.
Mulheres há que nunca tiveram uma relação extraconjugal, mas não suportam o marido. Permanecem com eles só por dependência financeira, criticando-os e desvalorizando-os para as amigas. No entanto, são consideradas fiéis... Alguns não concordam com a idéia de posse, que é a tônica da maioria das relações estáveis. Para eles a fidelidade está no sentimento recíproco que nutrem e nas razões que sustentam a própria vida a dois. Mas isso não tem nada a ver com ter ou não relações sexuais com outra pessoa. O problema é que, quando duas pessoas iniciam um namoro ou se casam, defendem a idéia de que quem ama deve contar tudo para o outro.
Conquanto na tônica da hegemonia machista-patriarcal, relutem os homens a aceitá-lo, fato é que o mesmo fenômeno, de maneira semelhante, porém inversa, acomete-os, com as particularidades que lhes são próprias, naturalmente.
O que importa numa relação não é apenas a própria relação, senão os seus atores, protagonistas. Quando tudo é conhecido, nada existe no outro que não se saiba, não há surpresa, não há novidade, não há descoberta. Surge, como conseqüência natural dessa vida tão sem emoção, profundo desinteresse. É assim com a maioria dos casais. Optam pela monotonia, pelo tédio por não suportarem as surpresas duma vida sem garantias preestabelecidas. Isso é só uma ilusão. Afinal, desde quando existe qualquer garantia na existência humana?
De maneira geral, numa relação estável, cobranças de fidelidade são constantes e é natural sua aceitação. Severa vigilância é exercida sobre os parceiros. O medo de ficar sozinho é tanto que é difícil encontrar quem reivindique privacidade e tenha maturidade emocional para saber que, se tiver um episódio extraconjugal, isso não diz respeito ao outro. Não é verdade que a única coisa que importa numa relação é a própria relação. Entretanto, restrições impostas e aceitas irrefletidamente ameaçam muito mais a relação do que a infidelidade em si.
Reprimir os verdadeiros desejos não significa eliminá-los. Quando a fidelidade se traduz por concessão que se faz ao outro, o preço se torna muito alto e pode inviabilizar a relação. Algumas pessoas já estão se dando conta disso e, talvez por lidar melhor com o desamparo e não se submeter cegamente às normas sociais, ousam soluções nada convencionais.
Uma instigante referência ao tema oferece-a Vinicius de Moraes (1913-1980), escritor, poeta e músico brasileiro, com o seu famoso soneto — Soneto da Fidelidade:
SONETO DA FIDELIDADE
De tudo, ao meu amor serei atento
Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto
Que mesmo em face do maior encanto
Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento
E em seu louvor hei de espalhar meu canto
E rir meu riso e derramar meu pranto
Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure
Quem sabe a morte, angústia de quem vive
Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa me dizer do amor (que tive):
Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.