São Martinho do Campo
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Brasão | |
Concelho | Santo Tirso |
Área | 3,44 km² |
População | 3 736 hab. (2001) |
Densidade | 1 086,0 hab./km² |
Orago | São Martinho |
Freguesias de Portugal |
São Martinho do Campo é uma freguesia portuguesa do concelho de Santo Tirso, com 3,44 km² de área e 3 736 habitantes (2001). Densidade: 1 086,0 h/km².
Até ao início do século XIX constituiu o couto de Francemil e tinha, em 1801, 503 habitantes. Após as reformas administrativas do início do liberalismo foi integrado no concelho de São Tomé de Negrelos.
A história das freguesias revela-nos um entrecruzar de vivências, um crescimento e progresso colectivos da vida dos seus habitantes. Algumas histórias de vida deixaram de forma preponderante a sua marca pessoal ao passarem ou residirem nessas terras. No caso de São Martinho do Campo assim aconteceu com o emigrado no Brasil Manuel Dias Machado, com o Comendador Abílio Ferreira de Oliveira e assim acontece com alguns dos actuais empresários que de forma mais discreta têm dado um contributo positivo ao progresso desta jovem vila de São Martinho do Campo.
Adaptação do texto do Prof. José Manuel Queijo Barbosa (Lic.) publicado no jornal “Notícias do Vale”
I - Localização
Santo Tirso é considerado um dos concelhos que se identificam mais genuinamente com o velho Entre Douro e Minho, sendo São Martinho do Campo uma freguesia situada no extremo Norte deste concelho, junto à margem do Rio Vizela. Pinho Leal, no seu Portugal Antigo e Moderno, refere que “a freguesia de São Martinho do Campo da comarca e concelho de Santo Thyrso era da corôa. Situada em uma campina sem vista para outras freguesias é terra muito fértil. Passa por ela o rio Visella que faz mover várias azenhas e dois engenhos de preparar linho. Tem uma ponte de pedra, chamada de Negrellos, duas capellas publicas e mais quatro particulares”. São Martinho do Campo esteve, então, incluída na Comarca e Termo do Porto, pertencendo primeiro ao Concelho de Refojos de Riba d’ Ave, depois ao Concelho de Negrelos e, posteriormente, com a extinção deste, viria a fixar-se no de Santo Tirso. Situada a cerca de 14 Km da sede do concelho, fica a sensivelmente a mesma distância de Guimarães, daí a identificação e um pouco a justificação da ideia avançada no início deste capítulo. É uma freguesia airosa que tem beneficiado dos melhoramentos rodoviários que foram sendo introduzidos na região nos últimos cinquenta anos, não sendo de admirar a explosão urbana e fabril que se apresenta como um facto bem real, que por sua vez espoletam novas necessidades e infra-estruturas. Localizada então na parte norte do concelho voltada para oriente e rodeada pelas freguesias de Roriz, São Mamede de Negrelos, Vilarinho e São Salvador do Campo, esta freguesia de São Martinho do Campo é um pólo aglutinador da população desta zona do concelho quer pelas infra-estruturas aqui surgidas (caso da escola básica integrada, instituições bancárias, etc.), quer pelos postos de trabalho criados, concretamente na indústria têxtil. A sua localização é ainda dominada pela passagem do rio Vizela na parte norte que estabelece de forma natural o limite com as freguesias de Lordelo e Moreira de Cónegos. A propósito do rio Vizela, neste abundavam no século XVIII peixes como bogas, escalos, barbos e trutas, bem patenteados por poetas antigos e contemporâneos em versos como os que se passam a transcrever: “ Corre el vizella amado Progresso sonoroso O Chrystalino ponto d’uma peña A ser favor de um prado.” Manoel Faria – Fonte de Aganipe “ Vem os que gozam do Vizella frio Em a ribeira amena, as águas claras, Grato, aprazível, brando, fresco rio, Senhor que as trutas dá no sabor raras.” Manoel Thomaz – Phoenix de Lusitânnia Para além da abundância de água cristalina, uma fonte de recurso natural de extrema importância e que irá explicar em parte o porquê da localização da indústria nesta região, é ainda de referir que o solo é predominantemente granítico (com uma faixa de terreno xistoso do Silúrico Superior e Inferior) e a vegetação muito variada e luxuriante, permitindo o cultivo da vinha e, outrora, a do linho.
II - A toponímia
A toponímia auxilia-nos a conhecer melhor e a caracterizar uma localidade, explicando a sua designação e de que forma surgiu, pese embora os documentos existentes serem por vezes escassos ou confusos, dificultando quem busca a clareza e a veracidade dos dados . Procurando identificar e explicar o topónimo, podemos dizer que São Martinho aparece já nas Inquirições do séc. XIII, (1220 – Sancto Martino de Campo e 1258 – Sancti Martini in Couto de Rooriz) numa referência à igreja com o mesmo nome e integrada no Couto de Roriz, apenas associada ao nome do orago (sobre este assunto falaremos mais adiante). Quanto ao termo “Campo”, do latim “Campu” (planície, campina), talvez fosse aplicada ao terreno pouco inclinado (chã) que se estende a norte do Monte da Citânia de Sanfins, localizada aqui bem perto. A data que marca o surgir da freguesia é difícil de identificar com rigor, mas pela documentação que a referencia é provável que já o seria desde o séc. IX ou X, uma vez que aparece citada antes da fundação da própria Nacionalidade. Nessa altura, numa situação geográfica privilegiada, os traços de uma ruralidade bucólica seriam por certos mais visíveis o que reforçaria uma beleza natural, bem de acordo com o topónimo.
III - População
“O território de Entre-Douro-e-Minho apresenta um tipo de povoamento rural, entre o disperso generalizado e um ou outro ponto de concentração, ambos situados ao longo de vias principais e secundárias por onde circulou sempre um autêntico formigueiro humano”. É assim que se refere o Dr. Paulino Gomes no texto introdutório de uma obra de referência para todas as freguesias, o Dicionário Enciclopédico das Freguesias. O mesmo autor caracteriza no mesmo texto esta região numa estreita ligação às origens castrejas das suas gentes e à grande importância que os rios Ave e Vizela vêm assumir na fixação e densidade populacional. O autor diz então que “Na sua origem pré-histórica e proto-urbana, estes povoados remontam por regra à cultura castreja, aqui densamente testemunhada pelos arqueólogos, em mais de mil locais”. São Martinho do Campo teria em 1758 perto de 470 habitantes, e em 1900, para 220 fogos contava já com 833 habitantes, sendo 383 do sexo masculino e 451 do feminino. De realçar que a partir dos anos 30 a população cresceu significativamente e o único decréscimo existente, entre as décadas de 60 e 70, ficou a dever-se ao facto de se terem desanexado desta freguesia alguns lugares, num total de 677 habitantes e 139 fogos, para constituírem a freguesia independente de São Salvador do Campo, tal como determinou o decreto-lei n.º 43 695, de 17 de Maio de 1961. Já em 1991 viria a atingir os 3 565 habitantes, o que a nível demográfico representava o décimo lugar entre as 32 freguesias que então compunham o concelho (posteriormente a esta data o concelho viria a perder uma parte significativa do seu território com a criação do concelho da Trofa), sendo então uma das mais populosas. No recenseamento geral da população efectuado em 1991 verificamos então que São Martinho do Campo possuía 3 565 habitantes, dos quais 1 778 eram do sexo masculino e 1 787 do sexo feminino. Os dados finais, embora ainda não oficiais, dos últimos censos realizados no ano transacto a freguesia de São Martinho do Campo chegou aos 3735 habitantes, dos quais 1834 são sexo masculino e 1 901 do sexo feminino, registando-se no entanto um total de 192 indivíduos residentes ausentes. Há ainda que referir que foram contabilizados 1240 alojamentos de tipo familiar e dois de alojamento colectivo, albergando 1198 famílias clássicas e apenas uma família de tipo institucional.
IV - História da freguesia
Em virtude da proximidade de São Martinho do Campo da citânia de Sanfins, é de crer que a cultura castreja tenha também influenciado o povoamento e a vida das gentes desta região. Sabemos que se dedicavam à caça, à pesca, à pastorícia e à criação de alguns animais domésticos, recursos facilmente encontráveis nestas paragens. No período romano, os hábitos foram sendo alterados e as populações encaminhadas mais para as planícies, onde as culturas eram mais viáveis, mudança que se coaduna novamente com esta região, comprovado o seu povoamento e exploração de recursos pela construção da famosa ponte de Negrelos. Após o surgimento do Cristianismo e na sequência da vinda de povos bárbaros, refugiar-se-íam nesta zona da Península Ibérica os Suevos, cuja capital, Braga não fica assim tão distante. É com os Suevos já cristianizados que vão nascer as paróquias e depois com os Visigodos as Dioceses, ora São Martinho fazia parte da Diocese Bracarense já no século XI. Por alturas da fundação da Nacionalidade, já São Martinho existia como freguesia. Por exemplo, em 28 de Novembro de 1116, numa doação ao Mosteiro de Roriz, feita por Menendo, filho de Gundisaluiz e de sua mulher Exemena Plagiz, “para remédio de suas almas” e “sustento de seus frades” – figuram: a villa de S. Pedro de Avioso (terra da Maia), inteira; a 5ª parte da Várzea (S. Mamede de Negrelos), a 6ª parte de Paderne (S. Martinho do Campo), e a 6ª parte de Canaveses – sede do concelho do Marco, cujo orago então era S. Pedro e depois mudou para S. Nicolau. No tempo de D. Sancho I, de cognome o Povoador, era frequente conceder-se a poderosos senhores a posse da totalidade ou de parte dos reguengos ou dos juldgados. No caso de São Martinho, o fidalgo Afonso Martins Vivaz possuía casais honrados no lugar da ponte. Posteriormente a esta altura algumas freguesias, incluindo a de São Martinho, vão parar às mãos do Infante D. João, filho de D. Pedro e D. Inês, e dele passaram à Infanta D. Beatriz. A par desta situação, também algumas igrejas e casais eram doadas a ordens monásticas, ora os Mosteiros de Roriz e de Vilarinho possuíam também vários casais e herdades em São Martinho do Campo. Em 1220, durante o reinado de D. Afonso II, aparece nas Inquirições Gerais com a denominação que tem actualmente. A identificação de Paderne, firmámo-la noutro documento, de 1223. dando conta da divisão de bens entre o prior e o cabido da Igreja de Guimarães. Ao prior coube a herdade de Paderne, com casal onde então vivia Gonçalo Garcia, em Negrelos; e ainda o casal de Pousada (também S. Martinho), e o de Negrelos: “…Item habeat et de cetero possideat (prior) campos de Sauto cum omnibus suijs decimjs . et hereditatem de padernj cum casali ubi nunc habitat Gonssaluus Garssie quod casale est in Njgrelos…et casale de egas et vilar cum casalj de pausada . de Negrelos . et…” E logo nas inquirições de 1258, em S. Martinho, se confirma que havia 2 casais, e um em Pousada, pertencentes a Santa Maria de Guimarães, havidos troca com o mosteiro de Roriz. Também aparece sob a epígrafe - S. Martinho no Couto de Roriz, ou S. Martinho de Negrelos. As primeiras inquirições, nas quais depôs o abade D. Capelão – Domnus Capellanus e mais dez testemunhas, dão conta da existência nesta freguesia de um certo reguengo, aliás doado por carta régia de D. Afonso II a determinado fidalgo do Burgo vimarenense, de nome – D. Vilão, que também era senhor de metade da igreja. Pagava então várias fossadeiras a El-Rei: de Quintaela, dois côvados de bragal; de Pausada, por uma certa quebrada, um soldo; e ainda pagavam da “voz” e “calúnia”, e forneciam vida ou comida ao “Mordomo”, quando vinha à terra. A propriedade foi arrolada desta forma: dois casais e meio, e umas “searas”, pertenciam à própria igreja; o Mosteiro de Landim tinha lá três casais; o de Vilela, um; o de Roriz era senhor da maior parte, ou seja, catorze casais; Santa Maria de Guimarães – quatro, e o Mosteiro de Vilarinho – três casais. Em 1258 era abade de S. Martinho do Campo – Gomécio Gonçalves, nomeado pelo arcebispo de Braga, mediante apresentação dos herdadores em cujas mãos estava o direito de padroado da igreja (origem inteiramente popular?). Nesta época a freguesia já tinha 32 casais repartidos por oito villas ou lugares, a saber: Ruivães Ruujããees – Reunia dez casais: oito do Mosteiro de Roriz, um do de Vilela, e outro de herdedores. Nenhum pagava foros nem recebia o “Mordomo”, por ser Couto de Roriz. Souto – Com seis casais: três do mosteiro de Caramelos (S. Martinho de Caramos – Felgueiras?), e de herdadores, tendo-os aquele mosteiro obtido herdadores do Couto de Roriz. Os outros três eram do Mosteiro de Roriz. Agrelo – Abrangia quatro casais: dois de herdadores, um do Mosteiro de Roriz, e outro da Igreja Local, comprado no tempo de D. Sancho II. Quintela Quintanela – Nesta villa situavam-se três casais, dentro do perímetro do Couto de Negrelos. Dois deles de herdadores, e um da igreja, havia de testamento de herdadores, pagando de fossadeira quinze dinheiros – dennarios. Paderne Padernj – Esta villa tinha três casais, pertencentes a Santa Maria de Guimarães, obtidos por troca com o Mosteiro de Roriz. Pousada Pausada - Com um casal, apenas, também de Santa Maria de Guimarães, em virtude da referida troca com o Mosteiro de Roriz. Ponte Pons – Com quatro casais: três de Afonso Martins e, um do Mosteiro de Vilarinho. Marecos – Aqui havia dois casias: um do Mosteiro de Vilarinho, e outro de Santa Maria de Guimarães (adquirido de herdadores) e da própria igreja de São Martinho do Campo. Pelas Inquirições de D. Dinis e D. Afonso IV, sabe-se que a parte oriental desta freguesia pertencia ao Couto de Negrelos, enquanto a outra parte estava enquadrada no Couto do Mosteiro de Roriz. Desde a Idade Média até ao segundo quartel do século XIX, viveu a região de Negrelos sob a égide de Refojos de Riba d’ Ave, no respeitante à administração civil e judicial, onde floresceram através dos séculos vários coutos e honras. As primeiras reformas do Liberalismo trouxeram o desmantelamento do concelho e equipararam alguns desses coutos e honras a concelhos: S. Mamede e Francemil, Roriz, Rebordões e Santo Tirso (que nasceu da extinção do seu mosteiro). Pela reforma de 1836 foi criado então o Concelho e Julgado de São Tomé de Negrelos e extintos os pequenos concelhos preexistentes dentro da sua área: Francemil, S. Mamede de Negrelos, Roriz, Rebordões e Refojos. São Martinho do Campo fazia parte integrante do concelho de S. Tomé de Negrelos. Com a extinção deste concelho, em 1855, passou a pertencer ao concelho de Santo Tirso, no qual se mantém até à actualidade. Recorde-se ainda um episódio interessante ocorrido no século XIX associado ao belo ex-libris que a civilização romana deixou na freguesia: a ponte de Negrelos. É célebre esta ponte de Negrelos pela resistência popular feita às tropas invasoras francesas na noite de 25 para 26 de Março de 1809, aquando da 2ª invasão, no momento da passagem da terceira ala do exército do General Soult (a 1ª na Trofa, a 2ª em Barcelos). Aqui se travou uma dura refrega, uma vez que a coragem do General Jardon em passar a ponte viria a ser-lhe fatal, pois um popular anónimo atirou a matar, provocando assim a raiva dos gauleses que carregaram com fúria na população. Aliás nas suas memórias o Général baron Marbot escreve: “[...]As vantagens que o Maréchal Soult (Soult foi promovido a marechal em 1847) vinha de obter em Braga foram bem fracassados pela perca que ele fez na mesma epóca, porque o General português Syveira, que se tinha atirado no flanco esquerdo da tropa francesa enquanto eles marchavam sobre Braga, a divisão Soult ignorando este triste evento deixou em Braga, a divisão Heudelet e continuou à marcha sobre Opporto. Os inimigos disputaram valentemente a passagem do rio Ave mas, foram todavia forçados. O General francês Jardon aí foi morto. Furiosos de sua derrota os Portugueses massacraram o seu chef o General Vallongo. [...]” Aludimos à resistência heróica, bem digna de Afonso Henriques, que o povo de São Martinho do Campo, Salvador e arredores opôs às tropas francesas. Custou a refrega cerca de 58 vidas. De São Martinho do Campo, pereceram: - António Ferreira, casado com Joana Martins, do lugar de Paderne; - Joaquim Ferreira, casado com Joana Martins, do lugar do Carvalhal; - Domingos Francisco, viúvo, da Ponte de Negrelos; - José Francisco, casado com Angélica Ferreira, da Ponte de Negrelos; - José da Cunha, casado com Custódia Machado, da “Bonna Vista”; - Manuel Ferreira, casado com Josefa Maria, do “Outeiro de Jinso”; - Joaquim, solteiro, filho de Maria Teresa, viúva que ficou de Custódio Machado, da Torre; - Pedro da Cunha, viúvo, da Escorregadoura; - António Alves, casado com Antónia Maria, do Monte; - Francisco Pereira, casado com Maria Martins, de “Rubais”; - Constantino, solteiro, e António, solteiro, ambos criados do Abade de São Martinho. Assim passaram os franceses a denominada Ponte de Negrelos. Este facto está registado no Livro de Óbitos da Freguesia. Uma curiosidade deste episódio tem a ver com o facto de nesse mesmo dia, noutro ponto da freguesia, terem aparecido quinze corpos, cuja proveniência ninguém conhecia, mas que foram piedosamente enterrados no lado Sul do adro da Igreja de São Martinho. Segundo contam as gentes da terra, durante muito o local era perfeitamente reconhecido, uma vez que a relva se conservava ali mais verde e viçosa. A verdade é que em 1891, o Abade João Pinto dos Reis, no Jornal de Santo Thyrso dizia “parece um protesto mudo da natureza contra a ingratidão dos homens, que deixaram no olvido esses martyres, sem ao menos lhes erguerem um modesto mausoléu: uma simples cruz” .
Na viragem do século XIX para o século XX e no decorrer deste, a vida da freguesia vai ser marcada pela acção de alguns beneméritos, como o caso do emigrado no Brasil (Rio de Janeiro) Manuel Dias Machado e do Comendador Abílio Ferreira de Oliveira, bem como pela sua crescente industrialização, acompanhando a tendência do concelho e sendo inclusive uma referência a nível nacional no ramo da indústria têxtil algodoeira. A terminar esta abordagem fica uma breve referência regional para recordar ainda os nomes de alguns ilustres do concelho como: São Rosendo (século X), filho dos condes Guterre Mendes e D. Ilduarda e que foi bispo de Mondonhedo (Galiza) com apenas 18 anos de idade, tendo desenvolvido uma obra monástica digna de relevo e vindo a falecer a 1 de Março de 977 em Celanova, último mosteiro que mandou construir; Manuel José Ribeiro, conde de São Bento (1807-1893), grande benemérito da sua terra natal; Alfredo Baptista Coelho (1865-1952), coronel que combateu no Ultramar e nas Flandres; António Faria Carneiro Pacheco (1886-1957) e Fernando Andrade Pires de Lima (1906-1970), jurisconsultos e ministros da Educação Nacional.
V - Uma paróquia importante
Como já se disse anteriormente a importância de São Martinho foi crescendo de forma gradual e isso foi igualmente notório na paróquia. Em 1320, por exemplo, D. Dinis obteve uma Bula Papal para cobrar a décima de todas as igrejas do país, tarefa que seria desempenhada pelo Núncio Apostólico, acompanhado por D. Raimundo, Bispo de Coimbra. Na cobrança desta renda vê-se claramente a importância de São Martinho do Campo, uma vez que aparece em quarto lugar em pé de igualdade com S. Mamede com 100 libras (valendo a libra 1.550 réis, na moeda de 1910), logo a seguir ao Mosteiro de Roriz (600 libras), de Vilarinho (250 libras) e da Igreja de S. Tiago de Burgães (200 libras). A partir desta altura o seu padroado começou a ser bastante disputado, atingindo mesmo contornos de luta cerrada em finais do século XV e meados do século seguinte: O Mosteiro de Roriz, antes de ser extinto e incorporado no padroado do Colégio de S. Paulo (com Sta Maria de Negrelos), também foi padroeiro: da capelania da igreja de virães, e, temporariamente da S. Martinho do Campo. Já no tempo do prior de Roriz, Rodrigo Álvares, a Igreja de S. Martinho foi unida ao seu mosteiro, com consentimento dos padroeiros leigos, enquanto durasse o seu priorado. Provisão expedida de Braga, em nome do arcebispo D. Jorge da Costa em 01/12/1491. O mesmo prior conseguira também a anexação do mosteiro de Vilarinho. Mesmo de Roma, onde se encontrava, passara procuração a João Álvares, administrador perpétuo do Priorado de S. Jorge de Coimbra, e a Sebastião Lobo, Dr em Cânones e Arcebispo de Lamego, segundo a concessão do Papa Sisto IV (14/01/1488). Também no priorado de D. João Fernandes igual concessão fez o Papa Júlio II, sobre a igreja de São Martinho do Campo, pelo que aquele prior mandou tomar posse da mesma Igreja, por procuração que fez em Roma, a 27/01/1505; ou até já no ano antecedente, como se depreende do Rescrito de 05/02/1504, sobre a demanda entre o prior de S. Paulo de Maçãs, Coimbra, Pedro Álvaro, e o prior de Roriz, reivindicando aquele o direito a certapensão na igreja da São Martinho do Campo. Entretanto, D. João Fernandes, deixou de ser prior de Roriz, mas julgara-se com direito à Igreja de São Martinho do Campo, onde estava intruso Álvaro Fernandes. Levada até Roma a contenda, terminou a favor d primeiro, pelas letras executórias de 08/06/1532, sendo Papa Clemente VII. Segundo outro documento, de 04/06/1535, São Martinho foi unida a Roriz somente em vida de Luís Fernandes, tendo-se este prior comprometido, ele e seus sucessores, a dar ao chantre de Guimarães, enquanto vivesse, a pensão anual de 50 ducados de ouro, a tirar dos réditos da Igreja. Pôs remate a esta tão movimentada questão a bula de Paulo III, de 02/03/1536, que confirmou a cessão da demanda, da parte do chantre Álvaro Fernandes, e uniu vitaliciamente São Martinho ao priorado de Luís Fernandes, suposto o consentimento de D. João III, já que a Igreja era do padroado real. Foi activo e influente o bacharel Luís Fernandes, último prior comendatário de Roriz, durante longo período. Em São Martinho do Campo, deixou o seu nome vinculado à capela da SS.ma Trindade ou do Espírito Santo – 1560. Nos séculos XVI e XVII é feito o Inventário da Colegiada de Guimarães, efectivado sob o priorado de D. Diogo Lobo da Silveira. As igrejas foram classificadas segundo o direito de padroado em três categorias: a) “Intituladas e anexas ad vitam da colação do arcebispo”; b) “Igrejas anexas in perpetuum”; c) “Na mesma terra, igrejas da apresentação de padroeiros”. São Martinho do Campo encontra-se referenciada na primeira categoria.
VI - O orago
Venerado a 11 de Novembro, São Martinho de Tours nasceu provavelmente no ano 317, num lugar chamado Sabária, na Panónia (Hungria). Como o pai era soldado do exército romano, levou-o consigo para Pavia, na Itália, onde ingressou na carreira militar. A princípio soldado, fez-se depois baptizar e começou uma carreira eclesiástica ao lado do bispo de Poitiers, Santo Hilário. Reza a história que numa noite foi avisado em sonho que tinha de ir evangelizar a sua pátria, e particularmente os seus pais, que como tantos outros na Panónia eram pagãos. Cinco anos mais tarde e depois de ter combatido o arianismo, regressou a Poitiers e pensou estabelecer na Gália a vida monástica. Fundou um mosteiro em Ligugé, onde se fixou até 371, altura em que foi eleito bispo da cidade de Tours. A sua acção episcopal foi grande, fundando numerosas paróquias e obtendo conversões em massa. O episódio que o tornou conhecido aconteceu em Amiens, na França, antes ainda de ter sido baptizado. Era uma manhã de rigoroso Inverno e Martinho ia de viagem no seu cavalo, quando reparou que na berma da estrada estava um mendigo, quase nu, tremendo de frio. Como não tinha consigo mais nada para lhe dar, tirou a capa, cortou-a com a sua espada e deu metade ao pobre homem. Iconograficamente aparece-nos frequentemente retratado como legionário romano, a pé ou num cavalo branco, mas pode igualmente surgir como bispo com mitra e báculo. Para além de surgir no episódio que o tornou conhecido, pode ainda aparecer com gansos como atributo, numa alusão ao facto de os gansos migrarem por altura da sua festa. Não se sabendo ao certo a relação de S. Martinho com as castanhas e o vinho, somos levados a crer que a tradição vem do facto da festa litúrgica em seu nome ocorrer numa altura do ano em que há muita abundância destes produtos, daí provérbios como: “Dia de S. Martinho, prova o teu vinho”, “Dia de S. Martinho, fura o teu pipinho” e “No S. Martinho, lume, castanhas e vinho”. É-lhe atribuída a frase: “Enquanto puder fazer algo sobre a Terra, não recusarei o trabalho”. S. Martinho, padroeiro desta freguesia com o seu nome, é-o também dos hoteleiros, cavaleiros e alfaiates. Não deixa de ser curioso que é precisamente a actividade industrial ligada aos têxteis a mais importante nesta terra.
VII - Património artístico
Os pontos de interesse que esta freguesia tem para oferecer aos visitantes e para usufruto e deleite dos locais são variados e com significativa importância histórica, tais como a Igreja Matriz, a capela do Espírito Santo ou a famosa Ponte de Negrelos. Apresentemos então uma sucinta descrição sobre o tema. A Igreja Matriz A Igreja Matriz (1705) de S. Martinho do Campo, segundo um trabalho recente de António e Lígia Oliveira (1999), “não tem merecido, por parte da História de Arte, a atenção que a sua especificidade justifica”. Na verdade, a igreja matriz, construída a partir de 1705, situada na Avenida Manuel Dias Machado, tendo do lado direito o cemitério da freguesia, ergue-se de forma vistosa, sendo protegida por um adro murado e lajeado que a antecede e a faz sobressair ainda mais na Avenida. Nesta construção surgiu o compromisso de André Machado, mestre pedreiro, fazer os alicerces da obra em terra firme e “em boa pedra”, segundo a escritura lavrada a 5 de Março de 1705, mas que, surpreendido pela morte poucos dias após a assinatura do contrato da obra, seria substituído por Francisco da Costa a 17 de Abril do mesmo ano, morador em S. Tiago de Areias, couto de Landim e termo de Barcelos, juntamente com Custódio de Melo, residente em S. Vicente de Passos, em Guimarães, ambos conhecidos oficiais de arquitectura. A igreja seria reformada em 1902, de acordo com a lápide colocada na sua frontaria. Apesar do aspecto robusto que o granito lhe confere, bem como o já referido muro que a circunda, a igreja matriz de S. Martinho do Campo apresenta ainda assim um recorte vistoso e elegante, sobretudo na sua torre sineira, característica que sobressai da fachada. É uma igreja de planta composta por nave única, capela-mor e sacristia com abertura para o exterior é de telhado de três águas, contém um arcaz e um lavatório em mármore. A cobertura de duas águas estende-se pela nave única e na capela-mor, sendo o tecto desta revestido a caixotões, pintados recentemente e onde podemos encontrar um retábulo com dois nichos laterais, contendo representações escultóricas de S. Martinho e de S. João Baptista. A decoração interior é predominantemente barroca, sendo visível o estilo nacional no altar-mor e nos quatro altares laterais de talha dourada. Deparamos no interior, com um coro-alto de madeira, uma pia baptismal sob o coro e um púlpito quadrado. Aparece referência em 1716 a Pedro Coelho, mestre entalhador, numa escritura celebrada em 10 de Março para a feitura do retábulo-mor e de um arcaz para a sacristia. Segundo os investigadores António e Lígia Oliveira (1999), “poderá ainda atribuir-se-lhe, embora com reservas, os quatro retábulos laterais” não obstante, até ao momento, não ter sido encontrado qualquer fonte documental para esclarecer este assunto. Registe-se ainda o relato do Abade da freguesia em 1758 que sobre a igreja escrevia: “Na Igreja há cinco altares; o Altar-Mor tem tribuna e sacrário, da parte da Epístola, São João, e do Evangelho, São Martinho; tem mais um altar de Nossa Senhora do Rosário, e outro com a imagem de Cristo crucificado, outro do Menino Deus, e outro de Santo António”. As capelas Ainda no âmbito do património religioso podemos encontrar na freguesia bonitas capelas, algumas das quais recentemente restauradas, custeadas pela fé das gentes e pelo contributo de empresários locais que ajudam financeiramente e com o seu bairrismo na conservação das mesmas. A mais recente data de 1902 e localiza-se junto à Casa de Beneficência Manuel Dias Machado, mas existem outras mais antigas, como a de Nossa Senhora do Espinho (1747) ou as capelas particulares nas casas do Outeiro, Arnozela, Souto e Ruivães. Pela sua antiguidade e curiosidade artística é digna de realce a Capela do Espírito Santo, fundada em 1560 por Luís Fernandes, Prior de Roriz, e situada no lugar da Trindade, não muito distante da igreja matriz. Nos finais do século XIX estava em mau estado de conservação, mas na verga da porta podia ainda ler-se com dificuldade a seguinte inscrição: Luiz Frz. Prior de Roriz Posuit.”1560” . Hoje, melhor cuidada, podemos observar que se trata de um pequenino templo, cuja galilé assenta sob duas colunas graníticas, protegida por um gradeamento. No seu interior surge então a curiosidade invulgar, já que no retábulo, de madeira pintada a óleo, pode ver-se a imagem do Redentor, com a singularidade de apresentar três rostos.
Outro património...
A nível de construção civil existem algumas casas com valor arquitectónico, sendo a mais conhecida a famosa Casa de Arnozela, um belo exemplar dos solares de Entre-Douro-e-Minho. O seu brasão, datado do séc. XVII, onde figuram as pedras de armas dos “Machado da Cunha de Faria Almeida”, esculpido em granito, é constituído por escudo de fantasia, elmo aberto, gradeado, com virol e timbre e motivos decorativos.
O cruzeiro, situado no lugar de Espinho. Bem que até à data não termos conseguido nenhum tipo de documentação sobre o dito cruzeiro, sabemos, graças as suas inscrições, que foi erguido em 1797.
A Ponte de Negrelos, admirável construção romana, mas que ficaria definitivamente ligada à história da freguesia e do país, pelo episódio ocorrido quando da segunda Invasão Francesa em 1809, facto já narrado. Por volta de 1835, foi redigido um projecto de criação do imposto de passagem nas pontes. Entre elas a Ponte de Negrelos. A nova postura rezava desta guisa: “-Passagens-Cada pessoa, a pé – cinco réis; a cavalo ou com uma cavalgadura à arreata, «ainda que carregada», - dez réis Cada rês ou junta de gado, ou cada «um sebado», «excepto sendo porcas parideiras que conduzem seus filhos, sendo estes de leite», acompanhados de uma até duas pessoas, - dez réis. E daí para cima, cinco réis por cada rês ou pessoa a mais, ou cavalgadura… As tais «porcas de criação que conduzam seus filhos de leite», com uma ou duas pessoas, também pagariam os dez rs.; Cada carro, «ainda que carregado», conduzido por até duas juntas de gado e até duas pessoas – vinte rs.; E cada liteira, mesmo carregada, acompanha por um ou dois arreeiros – vinte réis.” Numa prova de boa vizinhança e solidariedade humana e cristã, a postura logo previa isenções a este imposto: nada pagariam pela passagem os habitantes das freguesias confinantes e próximas das referidas pontes, dum e doutro lado do rio; assim como os que fossem acudir a qualquer desastre ou acompanhar o Sagrado Viático, e também os mendigos, os militares, os correios, e os presos e seus guardas. Posta em arrematação a cobrança deste imposto, não apareceram licitantes, simplesmente porque a despesa …não dava para a receita! Em 1853 foi restaurada a Ponte de Negrelos, que estava sem grades e o seu piso quase a tocar nas aduelas da arcaria. A Câmara de Negrelos gastou nessa obra 77$450 rs., e outro tanto despendeu o município de Guimarães por a ponte ser meeira aos dois concelhos. Das estradas novas projectadas pela Câmara, mencionaremos três, que afinal só muito mais tarde foram construídas: da Ponte de Negrelos a S. Mamede e Codeços; da dita ponte, por S. Martinho, ao lugar da Costa (Roriz), em direcção a Valinhas e daí ao encontro da nova estrada do Porto; de Roriz à Ponte de S. Tomé, em direitura a Santo Tirso. O seu custo foi orçado em 600$000 rs. Isto para sublinhar a importância da Ponte de Negrelos no passado e no presente, já que mesmo em mau estado, ela continua a ser uma das principais vias entre os concelhos de Santo Tirso e Guimarães.
VIII - A cultura viva
A cultura não se dignifica apenas pelo património natural e histórico que as gentes de uma terra valorizam e sabem preservar. A cultura é também a manifestação viva que revela o pulsar dessas gentes, praticado e revelado nas danças e cantares, na música e no teatro, nas festas e romarias, nas tradições mais diversas do religioso ao desportivo. Nas festas, da Senhora do Espinho (último domingo de Julho) ou de São Martinho (no fim de semana próximo de 11 de Novembro) o pretexto fica lançado para o folguedo humano, que ao som dos viras dos ranchos folclóricos ou de artistas populares se diverte ao mesmo tempo que venera os seus Santos de devoção. Não se vivem já os tempos de outrora, em que as toalhas de linho bordadas ao gosto da bordadeira saíam das arcas e postas nos campos verdes ou nas mesas serviam de pano de fundo para se colocar o vinho gostoso com que se enchiam as malgas, as broas de milho e os enchidos, numa significativa representação dos ciclos da terra, expressos no trabalho e revelados no pão, no vinho e no linho. Este tema ficaria incompleto se não fosse feita referência a duas associações dignas de registo: O Grupo Folclórico de São Martinho do Campo e a Associação Recreativa de São Martinho, que desempenham importantes papéis em prol da cultura e do desporto locais. O Grupo Folclórico de São Martinho do Campo nasceu a 23 de Abril de 1957 e é o melhor cartão de visita da freguesia, organizando todos os anos um importante Festival Luso-Ibérico desde 1960, com a participação dos nossos melhores grupos folclóricos e do país vizinho. Do seu historial podemos referir a obtenção da medalha de ouro da Festa do Traje de Entre-Douro-e-Minho, em 1961, e de primeiro classificado no 2º Festival Nacional de Folclore da província do Douro Litoral, em 1964. As deslocações ao estrangeiro têm sido constantes e honrosas para as gentes da terra. A Associação Recreativa de São Martinho do Campo, fundada a 1 de Março de 1965, sendo um dos fundadores o Comendador Abílio Ferreira de Oliveira, possui um parque de jogos, do qual era o legítimo proprietário, com balneários, posto médico, lavandaria e sede social. Em tempos idos militou nos Campeonatos Nacionais de Futebol (2ª Divisão), mas agora disputa a Divisão de Honra da Associação de Futebol do Porto. Outras colectividades surgiram posteriormente e vão desenvolvendo a sua obra por vezes com dificuldades, mas com persistência e esforço de vontade, como é o caso do Corpo de Escutas, da Escola de Música, da Associação Columbófila ou do grupo das Vicentinas.
IX - Actividades económicas
Santo Tirso é considerado o maior pólo do sector têxtil em Portugal, sendo São Martinho do Campo a maior concentração desta actividade económica. A sede do concelho e a freguesia localizam-se numa região agrícola fértil, sendo simultaneamente uma das mais industrializadas. Até aos anos 30 do século passado era uma freguesia essencialmente agrícola. A par de outros produtos produzia muito linho. Todas as quintas tinham os seus campos de linhares e, segundo Alberto Pimentel, na sua monografia de Santo Thyrso de Riba d’ Ave (1902), esta freguesia era a que mais linho produzia no concelho. Produzia o linho e trabalhava-o. Existe ainda hoje, perto da Rua do Ribeiro dos Asnos (antiga Rua da Venda), um moinho de linho que é testemunho do atrás referido. Recorde-se que o linho era já utilizado nesta região no tempo dos romanos. Vizinho do milho, ao longo dos anos muitas vezes se plantava conjuntamente. Depois, era o desenrolar de todo o ciclo do linho: depois de amadurecido na terra era arrancada ou arrincada a planta dos solos, num trabalho colectivo, a que se seguia o molhar, o secar e o amaçar. Depois de sair dos engenhos era então emanado e espadelado, livrando-o dos fragmentos lenhosos das palhas, continuando com a fase da fiação e, posteriormente, a própria tecelagem. Do linho ao algodão foi um passo. A partir dos anos trinta há um surto industrial dos têxteis. Surgem primeiro as fiações ao longo do rio e dos ribeiros convivendo com as serrações e moagens, aproveitando a força motriz da água. No período decorrido entre 1930 e 1946 proliferam em São Martinho do Campo as empresas têxteis, algumas das quais com uma solidez financeira e importante tecnologia que as transformam nas melhores do concelho e do país. O caso da fábrica de fiação e tecidos “A Flor do Campo, Ldª”, fundada por Abílio Ferreira de Oliveira a 25 de Abril de 1934, é um dos exemplos mais significativos deste tipo de empresas, tendo sido um exemplo para outras que se lhe seguiram. Com a electrificação da zona deu-se uma dispersão das indústrias (a princípio indústrias familiares) por outros lugares da freguesia e o aparecimento das tecelagens e mais tarde das confecções. Hoje, São Martinho do Campo continua a ter na indústria têxtil (fiação, tecelagem e confecção) a sua espinha dorsal na área económica, persistindo em ser a referência a nível concelhio e nacional. As empresas renovaram-se, continuam a introduzir nova tecnologia, procuram produzir mais e melhor, praticam técnicas de gestão actualizadas para manter a estrutura da empresa sólida e concorrencial, usam o marketing para vender melhor os seus produtos, conquistando clientes e mercados. O caso de maior sucesso é, sem duvida à “José Machado Almeida, S.A. - J.M.A.”. As conjunturas económicas nem sempre se apresentam benéficas para estas empresas, mas apesar de algum desemprego que há não muitos anos atrás se fez sentir na região do Vale do Ave, do qual São Martinho do Campo faz parte, a maior parte da população activa permaneceu maioritariamente ligada à indústria têxtil, havendo apenas uma parte que se distribui pelo comércio e construção civil. Quanto à agricultura, a mesma resume-se hoje a uma ou duas quintas sem grande significado em postos de trabalho.
X - Outros serviços
A vila de São Martinho não se fica apenas a nível económico pela actividade industrial, possuindo alguma agricultura, um comércio crescente, para além da prestação de serviços. A indústria, como já referimos, continua a ser a actividade dominante. Quanto à agricultura, esta foi já sucintamente já abordada quando se mencionou a importância da cultura do linho em tempos que já lá vão. Não podemos esquecer que a agricultura foi durante muitos séculos o grande meio de subsistência das pessoas desta região, sendo as culturas do vinho (verde) e do milho os elementos que compõem a trilogia a que se associa o linho. A nível de prestação de serviços, concretamente a nível de transportes, a freguesia possui perto dos seus limites a ligação ferroviária (via estreita) à sede do concelho, ao Porto e a Guimarães através da estação de Lordelo. Pela via rodoviária, para além dos veículos particulares existem carreiras com ligação a Vizela, a Santo Tirso e ao Porto. No que diz respeito a serviços ao dispor da população, a freguesia é servida por uma estação dos correios, já existente na década de 50, como documenta o jornal Semana Tirsense quando diz no dia 8 de Janeiro de 1956 que “uma estação dos Correios posta a servir uma enorme zona de laboração fabril como S. Martinho, Vilarinho, etc., é, na verdade, uma solução para muitos e contigenciais problemas que a Caixa Postal só por si de nenhum modo poderia suprimir e afligia a indústria ali situada”. A inauguração da Estação dos Correios e Telégrafo-Postal seria a 12 de Janeiro, data do aniversário do Comendador Abílio Ferreira de Oliveira, à qual estava pessoalmente ligado. No dia 30 de Setembro de 1957, segundo noticia o Jornal de Santo Thyrso na sexta-feira seguinte, “A donairosa e progressiva freguesia de S. Martinho do Campo esteve, no domingo, mais uma vez em festa, com a inauguração da sua nova casa dos Correios, que é um edifício moderno e elegante, para cuja edificação muito contribuiu, além da direcção dos C.T.T. e da Junta de Freguesia, o benemérito e importante industrial Sr. Abílio Ferreira de Oliveira”. Possui ainda uma delegação do Centro Regional de Segurança Social do Norte, uma sub-estação da Electricidade do Norte, três agências de instituições bancárias, um Centro de Saúde e uma Farmácia. Outrora dispôs de uma instituição hospitalar associada à Irmandade da Misericórdia local. Os estabelecimentos comerciais são bastante diversificados nos seus ramos, sobressaindo os cafés, restaurantes, mercearias e minimercados. O pronto-a-vestir, as papelarias, cabeleireiros, perfumarias e floristas marcam a sua presença, bem como lojas de electrodomésticos, materiais de construção, padarias, talhos, ourivesaria, drogaria, fotógrafo, enfim, o comércio habitual numa vila que ainda não sentiu a estabilização ou decréscimo da população residente, mas, pelo contrário, vê a mesma aumentar de forma constante, tal como o comércio que incrementa. À quarta-feira, a “Avenida das Tílias” ou “Trindade” ganha novo ânimo com a realização da feira semanal, oficializada em 1983 por votação da Assembleia de Freguesia que a aprovou por unanimidade. A população residente e a das freguesias circunvizinhas passaram a usufruir de um espaço de comércio ao ar livre que, para além de satisfazer as necessidades das pessoas, é sempre um momento de convívio num ambiente quase festivo. O mais curioso é que em 1839, a feira que se realizava no lugar da Igreja, em São Mamede de Negrelos, foi transferida para o lugar da Trindade, em São Martinho do Campo, porque lá não tinha concorrência. Por último, e não por menos, São Martinho do Campo viu, no dia 19/05/2002, o nascimento do jornal quinzenário “Notícias do Vale”, sediado em S. Martinho e noticiando as freguesias do “Vale”: São Martinho do Campo, São Mamede de Negrelos, S. Salvador do Campo, Vilarinho e Roriz.
XI - O ensino
Mencione-se também, de uma forma muito particular, o ensino na freguesia, que, pelo seu interesse, abordaremos de forma mais alongada, até porque ele se cruza com alguns dos principais benfeitores da freguesia do século passado, como Manuel Dias Machado e Abílio Ferreira de Oliveira. A escola, entendida como um espaço privilegiado de interacção humana, em que a formação e aquisição de conhecimentos diversos por parte dos jovens são uma realidade, aparece-nos em São Martinho do Campo com determinação e empenho. Sabe-se que foi uma das primeiras freguesias a acatar as decisões saídas das reformas do século XIX, caso da que impõe sanções às famílias se não mandarem os filhos à escola (1844) e da que divide a instrução primária em graus e estabelece o ensino gratuito (1870). O panorama escolar no virar para o século XX é bastante desolador a nível concelhio, mas a situação de São Martinho do Campo é deveras interessante e não acompanha essa imagem negativa do concelho. Foi a 28 de Fevereiro de 1894, na Casa de Arnozela, que se começaram a leccionar as primeiras aulas para crianças pobres de São Martinho do Campo e terras circunvizinhas, tendo como grande impulsionadores João Evangelista Faria e Almeida, a cuja família pertencia a Casa de Arnozela, e Manuel Dias Machado, um comerciante emigrado no Brasil, onde fez fortuna. Ambos fundaram a Irmandade e Misericórdia de Santa Maria. O relato lavrado em acta da inauguração das escolas, pelas dez horas da manhã, diz a determinada altura: “o revmº professor, aproveitando as palavras de Jesus ‘deixai que as criancinhas se cheguem a mim’ dirigiu aos seus discípulos uma allocução simples sim, como convinha às pequeninas capacidades intelectuais, mas comovente”. A 14 de Março de 1894, pelas onze horas da manhã, dá-se a inauguração da escola para o sexo feminino com a presença das figuras públicas locais e “mais de sessenta alumnas das escolas, todas vestidas de branco, acompanhadas da sua digna professora”, D. Rosa Dias Machado, tal como a acta lavrada nesse dia. Em 1901 a escola passa para um edifício apropriado, cuja construção se efectuava em terrenos cedidos por João Evangelista, então Presidente da Câmara Municipal de Santo Tirso. A escritura de doação data de 14 de Junho de 1899 e a intenção dos beneméritos era dotar as freguesias de São Martinho e São Salvador do Campo de escolas do ensino gratuito, de ambos os sexos, para as crianças pobres e desvalidas daquelas localidades do concelho de Santo Tirso, para além de lhes oferecer uma refeição diária, bem como, sempre que possível, os livros e algum agasalho. Como não havia ainda um método oficialmente obrigatório, seria adoptado nestas escolas “o alphabeto natural do Abbade d’Arcozello”. A escola do sexo masculino ficou com a denominação de “Escola de Santo António”, em honra deste Santo, enquanto que a do sexo feminino se designou de “Escola de Santa Maria”, em homenagem à Mãe de Deus e a D. Maria Alves Pimenta, da “Casa de Arnozela”. Recorde-se que a instituição, cujos estatutos foram concluídos a 2 de Novembro de 1898 e aprovados a 20 de Fevereiro de 1899, era classificada como “corporação religiosa, que tem por fim o exercício de actos de instrução, piedade e beneficência”, daí ter-se proposto a criar as escolas de ensino primário e também prestar “socorros espirituais aos seus confrades”. Com a instauração da República em 1910, mercê das alterações político-sociais que afectaram o religioso, a Irmandade e Misericórdia de Santa Maria passa a ser uma “corporação de instrução, beneficência e culto” e as escolas passam a designar-se por “Escola de Santa Maria” , para o sexo feminino, e “Escola Dias Machado”, para o sexo masculino, sendo retirada dos estatutos a qualificação de “corporação religiosa”. Em 8 de Dezembro de 1915, numa reunião da mesa da Irmandade, o Provedor Manuel Dias Machado propõe a venda de um piano oferecido em tempos por ele, quando se pretendia criar um “colégio de meninas”, onde pudessem aprender a arte da música, revelando assim as dificuldades económicas do momento. Esta situação prolongar-se-á e em 1924, lutando com grandes dificuldades, apelava-se ao Presidente da Junta Escolar de Santo Tirso a criação de uma escola oficial dos dois sexos na freguesia, utilizando-se também como argumento a distância a que moravam as crianças de São Martinho e de São Salvador do Campo em relação a escolas de freguesias vizinhas. Já nos anos quarenta, concretamente as eleições realizadas a 1 de Dezembro para Provedor são impugnadas, sendo a mesa administrativa da Irmandade dissolvida pelo Governador Civil do Distrito do Porto, António Pires de Lima, em 1 de Abril de 1941, e da comissão administrativa reafirma-se a beneficência e protecção do ensino. Entre Janeiro de 1942 e Fevereiro de 1951, bem como de Fevereiro de 1975 a Abril de 1980, a direcção da instituição tem como presidente o Comendador Abílio Ferreira de Oliveira, que na primeira data assumia ainda a Presidência da Junta de Freguesia de São Martinho do Campo. Da sua actuação inicial registe-se o cumprimento dos estatutos no que se refere à dádiva de um prato de sopa às crianças comprovadamente pobres, enquanto as restantes pagariam 25 centavos, para além de obras diversas que mandou executar. Regressando ao tema central, já na actualidade, a instituição está voltada para o apoio à infância, tendo surgido no seu edifício a Creche José Narciso Martins da Costa, marido da benemérita D. Raquel, e o Jardim da Infância José Machado de Almeida, cuja inauguração se efectuou em 20 de Dezembro de 1986 e cuja recuperação foi custeada pelo mesmo. Curioso é também a simbiose que a toponímia de São Martinho do Campo legaria para a posteridade, ao designar a conhecida “Avenida das Tílias” como “Avenida Manuel Dias Machado” , e curioso porque a esposa de Dias Machado se chamava precisamente Tília. Actualmente a freguesia possui duas escolas do 1º ciclo, a de Entre-Estradas e Aldeia do Monte e uma escola básica integrada, que juntou a escola do 1º ciclo de Escorregadoura (escola que deu continuidade à da casa Manuel Dias Machado e que é a maior e a mais central da freguesia) à escola dos 2º e 3º ciclos criada em 1989. Reconhecida como escola básica integrada a partir 1990, também através desta a freguesia assume um carácter inovador, uma vez que esta estrutura sequencial e vertical dos três ciclos do ensino básico foi uma das mais antigas do país e a primeira na região norte. Também esta escola, pelo facto de receber os alunos oriundos da própria freguesia, mas também de São Salvador do Campo, Roriz, São Mamede de Negrelos e Vilarinho, representa um bom indicador da população, observando-se um crescente e significativo aumento nos últimos dez anos, mantendo pela primeira vez a população escolar no presente ano lectivo.
--aj.matos 10:48, 8 Fevereiro 2007 (UTC) Bibliografia:
* Nótula sobre a obra de pedraria e talha da Igraja de S. Martinho do Campo (1705-1716) António José de Oliveira & Lígia Márcia Cardoso Correia de Sousa * À Roda de Negrelos Separata de O Concelho de Santo Tirso – Boletim Cultural * Jornal “Notícias do Vale”