Gregório de Matos
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Nascimento | 7 de abril de 1623 Salvador, BA |
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Falecimento | 26 de novembro de 1696 Recife, PE |
Nacionalidade | Brasileiro |
Ocupação | poeta |
Escola/tradição | Barroco |
Gregório de Matos e Guerra (Salvador, 7 de abril de 1623 ou 1633 — Recife, 26 de novembro de 1696), alcunhado de Boca do Inferno, foi um advogado e poeta brasileiro da época colonial. É considerado o maior poeta barroco do Brasil e um dos maiores poetas de Portugal.
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[editar] Biografia
Nascido numa família de proprietários rurais, empreiteiros de obras e funcionários administrativos de ascendência portuguesa (seu pai era natural de Guimarães, Portugal). De facto, a nacionalidade de Gregório de Matos é portuguesa, na medida em que o Brasil só se tornou independente no século XIX.
Em 1642 estudou no Colégio dos Jesuítas, na Bahia. Em 1650 continua os seus estudos em Lisboa e, em 1652, na Universidade de Coimbra onde se forma em Cânones, em 1661. Em 1663 é nomeado juiz de fora de Alcácer do Sal, não sem antes atestar que é "puro de sangue", como determinavam as normas jurídicas da época.
Em 27 de Janeiro de 1668 teve a função de representar a Bahia nas cortes de Lisboa. Em 1672, o Senado da Câmara da Bahia outorga-lhe o cargo de Procurador. A 20 de Janeiro de 1674 é, novamente, representante da Bahia nas cortes. É, contudo, destituído do cargo de procurador.
Em 1679 é nomeado pelo arcebispo Gaspar Barata de Mendonça para Desembargador da Relação Eclesiástica da Bahia. D. Pedro II nomeia-o em 1682 tesoureiro-mor da Sé, um ano depois de ter tomado ordens menores. Em 1683 volta ao Brasil.
O novo arcebispo, Frei João da Madre de Deus destitui-o dos seus cargos por não querer usar batina nem aceitar a imposição das ordens maiores, de forma a estar apto para as funções de que o tinham incumbido.
Começa, então, a satirizar os costumes do povo de todas as classes sociais bahianas (a que chamará "canalha infernal"). Desenvolve uma poesia corrosiva, erótica (quase ou mesmo pornográfica), apesar de também ter andado por caminhos mais líricos e, mesmo, sagrados.
Entre os seus amigos encontraremos, por exemplo, o poeta português Tomás Pinto Brandão.
Em 1685, o promotor eclesiástico da Bahia denuncia os seus costumes livres ao tribunal da Inquisição (acusa-o, por exemplo, de difamar Jesus Cristo e de não mostrar reverência, tirando o barrete da cabeça quando passa uma procissão). A acusação não tem seguimento.
Entretanto, as inimizades vão crescendo em relação direta com os poemas que vai concebendo. Em 1694, acusado por vários lados (principalmente por parte do Governador Antônio Luís Gonçalves da Câmara Coutinho), e correndo o risco de ser assassinado é deportado para Angola.
Como recompensa de ter ajudado o governo local a combater uma conspiração militar, recebe a permissão de voltar ao Brasil, ainda que não possa voltar à Bahia. Morre em Recife, com uma febre contraída em Angola.
[editar] Obra
Em 1850, o historiador Francisco Adolfo Varnhagen publicou 39 dos seus poemas na colectânea Florilégio da Poesia Brasileira (em Lisboa).
Afrânio Peixoto editou a restante obra, de 1923 a 1933, em seis volumes a cargo da Academia Brasileira de Letras, excepto a parte pornográfica que aparecerá publicada, por fim, em 1968, por James Amado.
A sua obra tinha um cunho bastante satírico e moderno para a época, além de chocar pelo teor erótico, de alguns de seus versos.
Entre seus grandes poemas está o "A cada canto um grande conselheiro", onde critica os governantes da "cidade da Bahia" de sua época. Esta crítica é, no entanto, intemporal e universal - os "grandes conselheiros" não são mais que os indivíduos (políticos ou não) que "nos quer(em) governar cabana e vinha, não sabem governar sua cozinha, mas podem governar o mundo inteiro". A figura do "grande conselheiro" é a figura do hipócrita que aponta os pecados dos outros, sem olhar aos seus. Em resumo, é aquele que aconselha mas não segue os seus preceitos.
[editar] Descrevo que era Realmente Naquele Tempo a Cidade da Bahia
A cada canto um grande conselheiro,
que nos quer governar cabana, e vinha,
não sabem governar sua cozinha,
e podem governar o mundo inteiro.
Em cada porta um freqüentado olheiro,
que a vida do vizinho, e da vizinha
pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha,
para a levar à Praça, e ao Terreiro.
Muitos mulatos desavergonhados,
trazidos pelos pés os homens nobres,
posta nas palmas toda a picardia.
Estupendas usuras nos mercados,
todos, os que não furtam, muito pobres,
e eis aqui a cidade da Bahia.
[editar] Epigrama
Que falta nesta cidade?... Verdade. Que mais por sua desonra?... Honra. Falta mais que se lhe ponha?... Vergonha.
O demo a viver se exponha, Por mais que a fama a exalta, Numa cidade onde falta Verdade, honra, vergonha.
Quem a pôs neste rocrócio?... Negócio. Quem causa tal perdição?... Ambição. E no meio desta loucura?... Usura.
Notável desaventura De um povo néscio e sandeu, Que não sabe que perdeu Negócio, ambição, usura.
Quais são seus doces objetos?... Pretos. Tem outros bens mais maciços?... Mestiços. Quais destes lhe são mais gratos?... Mulatos.
Dou ao Demo os insensatos, Dou ao Demo o povo asnal, Que estima por cabedal, Pretos, mestiços, mulatos.
Quem faz os círios mesquinhos?... Meirinhos. Quem faz as farinhas tardas?... Guardas. Quem as tem nos aposentos?... Sargentos.
Os círios lá vem aos centos, E a terra fica esfaimando, Porque os vão atravessando Meirinhos, guardas, sargentos.
E que justiça a resguarda?... Bastarda. É grátis distribuída?... Vendida. Que tem, que a todos assusta?... Injusta.
Valha-nos Deus, o que custa O que El-Rei nos dá de graça. Que anda a Justiça na praça Bastarda, vendida, injusta.
Que vai pela clerezia?... Simonia. E pelos membros da Igreja?... Inveja. Cuidei que mais se lhe punha?... Unha
Sazonada caramunha, Enfim, que na Santa Sé O que mais se pratica é Simonia, inveja e unha.
E nos frades há manqueiras?... Freiras. Em que ocupam os serões?... Sermões. Não se ocupam em disputas?... Putas.
Com palavras dissolutas Me concluo na verdade, Que as lidas todas de um frade São freiras, sermões e putas.
O açúcar já acabou?... Baixou. E o dinheiro se extinguiu?... Subiu. Logo já convalesceu?... Morreu.
À Bahia aconteceu O que a um doente acontece: Cai na cama, e o mal cresce, Baixou, subiu, morreu.
A Câmara não acode?... Não pode. Pois não tem todo o poder?... Não quer. É que o Governo a convence?... Não vence.
Quem haverá que tal pense, Que uma câmara tão nobre, Por ver-se mísera e pobre, Não pode, não quer, não vence.
[editar] Representações na cultura
Gregório de Matos já foi retratado como personagem no cinema e na televisão, interpretado por Waly Salomão no filme "Gregório de Mattos" (2003) e Ney Santanna no filme "Brasília 18%" (2006).
Gregório de Matos já foi narrado, também, no romance Boca do Inferno (1989) da escritora Ana Miranda, que é uma recriação literária do Brasil colonial, cujos personagens centrais são o próprio poeta e o jesuíta António Vieira, foi publicado com grande repercussão no Brasil e no exterior, e reconhecimento de críticos, leitores e professores, que o adotam para estudos literários do barroco brasileiro, tendo ficado na lista de mais vendidos do Jornal do Brasil durante um ano. Esse romance foi publicado em diversos países, tais como França, Inglaterra, Itália, Estados Unidos, Argentina, Noruega, Espanha, Suécia, Dinamarca, Holanda, Alemanha. Por esse livro a autora recebeu o prêmio Jabuti, em 1990.
[editar] Nota
Mais informações sobre o artista no Manual de Literatura Brasileira(Sergius Gonzaga, Mercado Aberto, Porto Alegre, cap. II, págs. 17-20, 1985).
[editar] Referências
[editar] Ligações externas
- Gregório de Mattos e Guerra: uma visita ao poeta
- Memória viva de Gregório de Matos
- Obra Poética, de Gregório de Matos