Guerra Civil Espanhola
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A chamada Guerra Civil Espanhola foi um conflito entre duas frentes militares, ocorrido na Espanha entre os anos de 1936 e 1939. A vitória coube aos nacionalistas de Francisco Franco.
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[editar] Precedentes
A derrubada temporária dos Bourbons absolutistas por Napoleão I em março de 1808 , a Guerra de Independência contra a ocupação francesa, a abertura das Cortes de Cádiz em 1810 e a proclamação da Constituição liberal de 1812 assinalam o desaparecimento do Antigo Regime espanhol, que havia chegado, durante o reinado de Carlos III da Espanha, a ser considerado como um exemplo de Despotismo Esclarecido. Durante todo o século XIX e o início do século XX, no entanto, a Espanha não conseguiu completar, política e socialmente, a sua revolução burguesa de forma a produzir uma institucionalidade liberal-democrática estável. O século XIX espanhol foi um período especialmente conflitivo, com lutas entre liberais e absolutistas, entre membros rivais da Casa de Bourbon (isabelinos e carlistas), e mais tarde entre monarquistas e republicanos, sobre o pano de fundo da perda das colônias americanas e filipinas.
A economia espanhola teve um crescimento rápido desde o final do século XIX até ao início do século XX. Em especial, as indústrias mineiras e metalúrgicas lucraram e expandiram-se enormemente durante a primeira guerra mundial, fornecendo insumos a ambos os lados. Entretanto, os resultados desse crescimento não se refletiram em mudanças nas condições sociais. A agricultura, sobretudo na Andaluzia, continuou em mãos de latifundiários, que deixavam grandes extensões de terra sem cultivar. Somava-se a isto a forte presença da Igreja Católica, que se opunha às reformas sociais e se alinhava aos interesses da elite agrária. Finalmente, a monarquia espanhola apoiava-se no poder militar para manter o seu regime. O fim da monarquia e o advento da república (1931) nada mudou nesta configuração política básica, com a agravante de que esses sectores se mantiveram monárquicos e as tentativas de golpe tornaram-se constantes.
Com o crescimento da economia, houve o crescimento do movimento operário. Após a fundação do primeira sociedade operária em Barcelona (1840), o movimento cresce e se espalha pelo país. Desde o início, e principalmente na Catalunha, que é a principal região industrial de Espanha, o anarquismo cria raiz e é a tendência política mais popular entre os operários. A principal confederação sindical, a CNT (Confederación Nacional del Trabajo), sob influência anarco-sindicalista, recusa-se a participar na política partidária.
O choque entre classes é frequente e violento. Desde o fim do século XIX até ao início do século XX, grupos de extermínio como o Sindicato Libre procuram suprimir os sindicatos através do assassinato dos seus principais militantes. Do outro lado, grupos de militantes sindicalistas, como o famoso Nosotros, também assassina religiosos e industriais suspeitos de apoiar o Sindicato Libre. Insurreições armadas, tanto de direita como de esquerda ocorrem com regularidade.
[editar] O fim da monarquia, a eleição da Frente Popular e o golpe
Com a renúncia do ditador Primo de Rivera após uma onda de escândalos de corrupção, o rei Alfonso XIII procurou restaurar o regime parlamentar e constitucional. Foram convocadas eleições em Abril de 1931, e embora os monarquistas tenham saído vitoriosos, os republicanos conquistaram a maioria nas grandes cidades. Prevendo uma guerra civil, o rei Alfonso XIII prefere abdicar e proclama-se a Segunda República. Novas eleições são convocadas para compor uma assembleia constituinte em Junho, que proclama a separação entre Igreja e Estado. Por este motivo, Alcalá Zamora, chefe do governo provisório, abdica. Novas eleições acontecem em Dezembro de 1931, nas quais a esquerda sai vitoriosa. Alcalá Zamora é eleito Presidente da República e encarrega Manuel Azaña de organizar um governo. O governo da República não consegue avançar na resolução da questão das autonomias regionais, nem no encaminhamento da questões agrária e trabalhista. Na questão religiosa, a governo Azaña tentou ceder, de forma moderada, ao espírito anticlerical que predominava no parlamento através da dissolução da Companhia de Jesus na Espanha e na preservação das demais ordens religiosas, que no entanto eram proibidas de dedicar-se ao ensino.Comprimido entre a direita e a Igreja - os quais viam a laicização do Estado e da educação de maneira muito negativa - e a esquerda e os anarquistas -os quais consideravam as mesmas reformas insignificantes - o governo Azaña é incapaz de agradar a população.
Como economia predominantemente agrário exportadora, A Espanha havia sido pouco atingida pela Crise de 1929: o desemprego era pequeno e o salário médio por dia trabalhado havia aumentado significativamente nos primeiros anos da Segunda República. Apenas este aquecimento da economia aguçava as tensões sociais já existentes, e com elas a aguda divisão político-ideológica da sociedade, que vinha desde o século anterior.
Os anarquistas em maio de 1931 incendiaram a Igreja dos Jesuítas na Calle de la Flor, no centro de Madrid.Em agosto de 1932, o general monarquista Sanjurjo tenta dar um golpe, o qual fracassa, sendo Sanjurjo condenado a morte e depois indultado, continuando a conspirar na prisão.
Em 1933, a recusa dos anarquistas em dar apoio aos partidos de esquerda, e sua propaganda pela "greve do voto", permite a victória eleitoral da direita, representada pela Confederação das Direitas Autônomas (CEDA) de José Maria Gil Robles. Segue-se uma insurreição de esquerda, que foi mal sucedida em toda a Espanha, menos nas Astúrias, onde os operários dominaram Gijón por 13 dias. Este evento ficou conhecido como Comuna das Astúrias.
Com milhares de militantes feitos prisioneiros, os anarquistas decidem apoiar a esquerda nas eleições de 1936. Espera-se que o novo governo lhes conceda anistia. A esquerda vence em 16 de Fevereiro, com 4.645.116 votos, contra 4.503.524 da direita e 500.000 votos do centro, mas as particularidades do sistema eleitoral- que favorecia as maiorias - dão à esquerda a maioria das cadeiras no parlamento [1]. Alcalá Zamora encarrega Azaña de formar um governo. Em maio de 1936, Alcalá Zamora é destituído e Azaña assume a Presidência da República, tendo como seu primeiro-ministro o socialista Largo Caballero. A direita então lança-se a preparar um golpe militar que se concretiza em 18 de Julho.
Neste processo, a Igreja desempenha um papel destacado. Ao mesmo tempo que esta propagandeia a revolta contra o governo- e mais tarde, chegaria a compará-la, numa declaração coletiva de todo o episcopado(1o. de julho de 1937) com uma cruzada moderna - ela também se torna alvo do descontentamento dos setores mais à esquerda, que incendeiam vários de seus templos e conventos. Nesse contexto, o governo se recusa a reprimir esses ataques, se colocando ao lado da esquerda anticlerical. Na medida em que a Guerra Civil foi a conclusão dos enfrentamentos político-ideológicos do século XIX espanhol, a identificação da Igreja com a Direita determinou o anticlericalismo da Esquerda na sua generalidade.
A perseguição religiosa continou: nos quatro meses que precederam a guerra civil houve 160 igrejas incendiadas. Entre os milhares de civis mortos pelos comunistas, anarquistas e socialistas, estão pelo menos 6 mil padres, freiras e monges, além de 12 bispos, muitos foram queimados vivos e outros foram enterrados ainda com vida.
Muito embora houvessem sido realizados esforços de propaganda pelos republicanos no exterior em favor da liberdade religiosa, de forma a não alienar a opinião pública católica, o campo republicano era em geral anticlerical e apoiava a repressão à Igreja: o escritor inglês George Orwell aplaudiu a destruição generalizada de igrejas na zona republicana e lamentou que a ingreja da Segrada Família, em Barcelona, projetada por Gaudí, não houvesse também sido destruída por seu "valor artístico" - no seu entender, duvidoso. O Presidente da República Manuel Azaña, em um de seus muitos discursos, disse que preferia ver todas as igrejas de Espanha incendiadas a ver uma só cabeça republicana ferida.
[editar] Dois contingentes militares
De um lado lutavam a Frente Popular, composta pela esquerda (e extrema esquerda como o comunismo, anarquismo mas também o governo eleito liberal-democrático) e os nacionalistas de Galiza, País Basco e Catalunha, que defendiam a legitimidade do regime instalado recentemente no Estado, (a República proclamada em 1931 e os respectivos Estatutos de Autonomia).
Do outro lado os nacionalistas (compostos por monárquicos, falangistas, e militares de extrema direita, etc. O seu referente político (sobretudo para a Falange) era o general Sanjurjo, cheve da intentona militar de 1932, mas que morreu num acidente aéreo ao transladar-se de Portugal para a zona ocupada pelos nacionalistas.Só durante o decorrer da guerra, os nacionalistas, chefiados pelo militar Francisco Franco irão aceitar progressivamente a sua indiscutível liderança.
[editar] O "Movimiento Nacional" de Franco
A sublevação fascista tentava impedir a qualquer preço que as instituições republicanas assentassem de maneira estável e permanente o regime democrático, impedindo o trabalho de um governo real de esquerda que estava para realizar profundas reformas económicas, jurídicas e políticas no conjunto do Estado. Sob o suposto afã de lutar contra o perigo do aumento do comunismo e do anarquismo em certos lugares do Estado, ocultava-se realmente o levantamento contra o regime institucional e democrático estabelecido, na tentativa de impedir a continuação e assentamento da democracia e daquilo que os fascistas consideravam intoleráveis experiências de colectivismo.
Mas outra das claras intencionalidades do chamado "Movimiento Nacional", além de lutar contra o "perigo vermelho", foi lutar contra o que consideravam o "perigo separatista" tentando impedir a todo preço a instituição dos governos autónomos nas nações chamadas históricas, de que a guerra foi o máximo exponente de até onde é que estavam dispostos a chegar na sua defesa da unidade e uniformidade da Espanha.
Aliados à Igreja Católica, Exército e latifundiários, buscavam implementar um regime de tipo fascista na Espanha,o que consideravam mais condizente com a "originalidade espanhola (suas tradições políticas de raiz católica e autoritária).
[editar] Os apoios internacionais
As tropas do chamado "Movimiento Nacional" foram reforçadas pela ajuda militar directa da Alemanha de Hitler, expressa no bombardeamento a Guernica e Madrid, e da Itália de Mussolini. O Vaticano apoiou igualmente Franco, pois a Igreja condenava o comunismo - e também porque a política anticlerical do governo da República não lhe oferecia outra alternativa[2]. Não obstante, no País Basco- que ficou isolado do restante da zona republicana desde o início da guera - grande parte do clero católico colocou-se ao lado do nacionalismo basco e pela República, escapando assim à sorte dos seus análogos no restante do território republicano, onde as igrejas foram saqueadas e os padres perseguidos como agentes do fascismo.
As tropas republicanas receberam ajuda internacional, proveniente da URSS (alguns assistentes militares e material bélico) e das Brigadas Internacionais composta de militantes de frentes socialistas e comunistas de todo o mundo e de numerosas pessoas que a título individual entravam na Espanha a defender o governo da República. Vários intelectuais europeus e americanos participaram deste esforço, nomeadamente o romancista americano Ernest Hemingway, o escritor inglês George Orwell, o poeta também inglês W. H. Auden, os escritores franceses André Malraux e Saint-Exupéry e a matemática, católica e activista política, também francesa, Simone Weil.
Os governos da Inglaterra e da França, optaram por ficar de fora, impondo um embargo geral à exportação de armas à Espanha. Oficialmente, este embargo foi furado pela Alemanha e pela Itália, e não levou a qualquer consequência, na ausência de sanções impostas pela Liga das Nações).
[editar] A política de Stalin e a derrota da República
Para os anarquistas, boa parte da culpa da derrota do campo republicano espanhol pode ser creditada à política de Josef Stalin, que, desejoso da vitória da República, mas temendo que esta vitória levasse a uma revolução socialista na Espanha que criasse complicações diplomáticas à União Soviética, foi capaz apenas de realizar uma ajuda militar tímida, pelo envio de alguns militares, aviões e armas (por estas exportações de armas, Stálin fêz-se pagar com a reserva de ouro do Banco Central Espanhol[3]). Segundo este ponto de vista, instalou na Espanha uma série de agentes da sua polícia secreta, o GPU, que desencadeou uma política de repressões indiscriminadas contra militantes de Extrema Esquerda, anarquistas e trotskistas, visando conter a Guerra Civil dentro de um marco democrático-liberal. O ponto alto destas repressões foi a prisão e morte sob tortura de Andrés Nin, dirigente catalão do semi-trotskista POUM - Partido Operário de Unificação Marxista. Para cúmulo, Stálin ainda encarcerou e matou como traidores os executantes desta política (tais como o velho bolchevique Antonov-Ovssenko) quando do seu retorno á URSS, de modo a impedir o questionamento de sua política espanhola.
Teve fim a guerra com a consequência da morte de mais de 400 mil espanhóis e uma queda enorme na economia, como a morte de mais da metade do gado,a queima de vários campos e milhões de moradias destruidas. Um abalo financeiro e queda do PIB que demorou quase 30 anos para se normalizar. Outras fontes ressaltam a dificuldade em quantificar o número de mortos por causa da guerra originada pelo chamado "Movimiento Nacional", mas colocam o dado para todo o período do franquismo de mais de 2 milhões de pessoas mortas sob o regime fascista.
[editar] A Revolução Social
Nas áreas controladas pelos anarquistas, Aragão e Catalunha, somando-se às suas vitórias militares temporárias, existiu uma grande mudança social na qual os trabalhadores e camponeses se apoderaram da terra e da indústria, estabeleceram conselhos operários paralelos ao governo, que estava paralizado, e autogestionaram a economia. Esta revolução ocorreu à revelia dos republicanos e comunistas apoiados pela União Soviética. A coletivização agrária obteve um êxito considerável, apesar da carência de recursos, já que as terras com melhores condições para o cultivo estavam em poder dos "Nacionais". Esse êxito sobreviveu na mente dos revolucionários libertários como uma prova de que uma sociedade anarquista pode florescer sob certas condições como as que haviam durante a Guerra Civil Espanhola.
Mais tarde durante o conflito, o governo e os comunistas receberam armas soviéticas, com as quais restauraram o controle do governo e se esforçaram por ganhar a guerra através da diplomacia e do poder bélico. Os anarquistas e os membros do POUM foram integrados ao exército regular, ainda que a contragosto, e o POUM foi declarado ilegal, após ser falsamente denunciado como instrumento dos fascistas. Num dos episódios mais dramáticos da Guerra, centenas de milhares de soldados comunistas e militantes anarquistas, ambos antifascistas, enfrentaram-se uns aos outros pelo controle dos pontos estratégicos de Barcelona, nas chamadas "Jornadas de Maio de 1937". Por trás desse conflito estava a divergência básica entre PCE de um lado e POUM e CNT de outro: estes acreditavam que a guerra devia servir para conduzir à vitória na revolução que tinham iniciado; já o PCE acreditava que a revolução lhes minava os esforços diplomáticos para ganhar o apoio das potências ocidentais contra o fascismo, assim como seu esforço de controle sobre a economia e a sociedade de maneira geral.
[editar] A guerra civil na Galiza
Na Galiza, zona da "retaguarda fascista" (militarmente ocupadas logo no início), a luta republicana encontrou a forma de guerrilhas organizadas que levaram a luta até depois do ano 1940.
A resposta através do método das guerrilhas manteve-se na Galiza até 1956 com muita força, iniciando-se um período de decadência a partir desta data, devida em parte ao abandono dessa estratégia por parte do PCE, até ocorrerem os últimos assaltos e combates em 1967, com a morte do último guerrilheiro e o exílio doutros.
Segundo dados fornecidos por diferentes historiadores foram presas ou mortas cerca de 10.000 pessoas relacionadas com a guerrilha galega durante esses anos.
O Franquismo instaurou na Galiza o método dos "passeios" (ir procurar pessoas a sua casa para "passeá-los", isto é fuzilá-los à noite e deixá-los nas valetas). Através deste método do "passeio", dos conselhos de guerra realizados contra civis, dos fuzilamentos maciços dos prisioneiros e dos confrontos armados com a guerrilha morreram 197.000 pessoas galegas (fonte "La Guerra Civil en Galicia" edic. La Voz) durante o regime franquista, das quais a grande maioria continua em valas comuns. Quanto ao exílio, cerca de 200.000 galegos fugiram exilados para outros países nesse período.
Por outro lado, os campos de concentração mais conhecidos na Galiza são os de Lubiám, Lavacolha (Compostela) e o cárcere de extermínio da Ilha de S. Simão (Vigo), assim como os respectivos cárceres de cada cidade. Existem ainda em cada cidade ou vila lugares ainda não reconhecidos de fuzilamento maciço e continuado de pessoas que foram consideradas "perigosas" para o regime fascista.
[editar] Referências
- ↑ Cf. Tuñón de Lara, apud Antonio Domínguez Ortiz, España: Tres Milenios de Historia, Madrid, Marcial Pons, 2001, pg.332
- ↑ Cf. Domínguez Ortiz, op.cit., pgs.340/341
- ↑ Stalin disse ao Politburo que "os espanhóis terão tanta chance de ver este ouro de novo quanto de contemplarem suas próprias orelhas", apud Vadim Z. Rogovin, 1937-The year of Stalin's Terror, Oak Park, 1998, Mehring Books,pg.339
[editar] Ligações externas