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José Bonifácio de Andrada e Silva

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José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca da Independência do Brasil
José Bonifácio de Andrada e Silva, o Patriarca da Independência do Brasil
Nota: Se procura outras acepções, consulte José Bonifácio (desambiguação).

José Bonifácio de Andrada e Silva (Santos, 13 de Junho de 1763Niterói, 6 de Abril de 1838), o Patriarca da Independência, foi um naturalista, estadista, poeta e maçom brasileiro. Pode-se resumir brevemente sua atuação dizendo que foi ministro do Reino e dos Negócios Estrangeiros de janeiro de 1822 a julho de 1823.De início, colocou-se em apoio à regência de D. Pedro de Alcântara. Proclamada a Independência, organizou a ação militar contra os focos de resistência à separação de Portugal e comandou uma política centralizadora. Durante os debates da Assembléia Constituinte, deu-se o rompimento dele e de seus irmãos Martim Francisco Ribeiro de Andrada e Antônio Carlos Ribeiro de Andrada Machado e Silva com o imperador. Em 16 de julho de 1823, D. Pedro I demitiu o ministério e José Bonifácio passou à oposição. Após o fechamento da Constituinte, em 11 de novembro de 1823, foi banido e se exilou na França por seis anos. De volta ao Brasil, reconciliado com o imperador, assumiu a tutoria de seu filho quando da abdicação, em 1831, cargo do qual foi demitido em 1833 pelo governo da Regência.

Índice

[editar] Origem familiar

Membro de família da aristocracia portuguesa, nasceu em Santos, nos fins do século XVIII «pequena vila colonial em declínio», com apenas 13 ruas, no litoral da então Capitania de São Paulo. O pai, Bonifácio José Ribeiro de Andrada, casado com Maria Bárbara da Silva, era a segunda fortuna da cidade, possuidor de bens no valor de 8:000$000. José Ribeiro de Andrada, o avô, casada com Ana da Silva Borges, vindo para o Brasil, pertencia a antiga família portuguesa do Minho e de Trás-os-Montes, parente dos condes de Amares e marqueses de Montebelo, ramo dos Bobadelas-Freires de Andrada. Bonifácio José, que morreria em 1789, era «muito ágil, desembaraçado e inteligente». Arredondou sua fortuna como mercante e ocupante de diversos cargos e ofícios. Tinha dois irmãos formados em Coimbra e um terceiro irmão padre. Sua mãe, D. Maria Bárbara da Silva, teve 10 filhos, quatro mulheres e seis homens. José Bonifácio nasceu a 13 de junho de 1763. Seu pai foi seu primeiro mestre, mas em Santos não era possível ir além do ensino primário, já que «a ignorância dos povos da colônia seria antes elemento de dominação política e exploração econômica» de que dispunha Portugal. Mudou-se para São Paulo em 1777.

[editar] Estudos

Em São Paulo, freqüentou aulas de Gramática, Retórica e Filosofia nos cursos abertos por D. frei Manuel da Ressurreição, dono também de boa biblioteca. Era o ensino prepatório para o ingresso na universidade em Coimbra, para onde iam os brasileiros com alguns recursos. Tinha 16 anos quando, com seus irmãos Bonifácio José, Antônio Carlos e Martim Francisco, requereu habilitação de genere, passo indispensável à carreira eclesiástica. Não havia universidades no Brasil nem qualquer prelo... Em 1783, partiu do Rio de Janeiro para Portugal, matriculando-se em outubro na Universidade de Coimbra e iniciando a 30 de outubro seu curso de estudos jurídicos, acrescidos um ano mais tarde, 11 e 12 de outubro de 1784, dos de Matemática e Filosofia Natural. Mais do que os cursos, leu! Já poetava e em uma ode sua surgem os nomes de Leibnitz, Newton, Descartes - leu sobretudo Rousseau e Voltaire, mas leu Montesquieu, Locke, Pope, Virgílio, Horácio, Camões, e se indignou contra o «mostro horrendo do Despotismo», seus versos apelam para as promessas da independência recém-proclamada dos Estados Unidos da América do Norte. Ainda estudante, cuidou de duas questões por cuja solução em vão se empenharia mais tarde: a civilização dos índios, a abolição do tráfico e da escravidão dos negros.

[editar] Carreira

Cedo demonstrou vocação para as pesquisas científicas. A exploração de minas conhecia um auge considerável, com o crescimento das necessidades ligadas à revolução industrial. José Bonifácio concluiu em 16 de junho de 1787 seu curso de Filosofia e a 5 de julho de 1788 o de Leis. Recebeu em Portugal apoio do duque de Lafões, D. João de Bragança, que em 1780 fundara a Academia Real das Ciências de Lisboa, e a 8 de julho de 1789 fez, perante o Desembargo do Paço, a leitura que o habilitava a exercer os lugares da magristratura. Cinco meses antes, em 4 de março, fora admitido como sócio livre da Academia, o que lhe abrira os caminhos de uma carreira de cientista. Por temperamento, interessava-se por estudos de que resultassem alguma utilidade, colocando a ciência a serviço do aperfeiçoamento humano. Tinha por divisa: Nisi utile est quod facimus, stulta est gloria. Sua primeira Memória apresentada à Academia foi: Memória sobre a Pesca das Baleias e Extração de seu Azeite: com algumas reflexões a respeito das nossas Pescarias.

[editar] Excursão científica pela Europa

Foi comissionado em 18 de fevereiro de 1790 para empreender às custa do Real Erário uma excursão científica pela Europa, para adquirir, por meio de viagens literárias e explorações filosóficas, os conhecimentos mais perfeitos de Mineralogia e mais partes da Filosofia e História Natural.

Eis assim José Bonifácio em Paris nos meados de 1790, na fase inicial da Revolução Francesa! Cursou como lhe cumpria os estudos de Química e Mineralogia de setembro de 1790 a janeiro de 1791, e até abril aulas da Escola Real de Minas. Seus biógrafos citam contactos com Lavoisier, Chaptal, Jussieu e outros. Foi eleito sócio correspondente da Sociedade Filomática de Paris, membro da Sociedade de História Natural, para a qual escreveria uma Memória sobre diamantes no Brasil, desfazendo erros. Já não era um simples estudante - começava a falar com voz de mestre. Partiu depois para aulas práticas na Saxônia, em Freiberg, cuja Escola de Minas frequentou em 1792, recebendo dois anos mais tarde um atestado de que havia frequentado um curso completo de Orictognosia e outro de Geognosia. Percebia o atraso de Coimbra em relação a outros centros de estudo na Europa - a escola de Freiberg marcará sua orientação. Ali teve como amigos Alexander von Humboldt, Leopold von Buch, Del Rio. Percorreu minas do Tirol, da Estíria, da Caríntia, foi a Pavia, na Itália, ouvir lições de Volta, em Pádua investigou a constituição geológica dos Montes Eugâneos, escrevendo a respeito um trabalho em 1794 (Viagem geognóstica aos Montes Eugâneos). Onde deu completo desenvolvimento a seus estudos foi na Suécia e na Noruega, a partir de 1796, caracterizando em jazidas locais quatro espécies minerais novas e oito variedades que se incluíam em espécies já conhecidas - a todos esses minerais descreveu pela primeira vez e deu nome.

Viajou mais de dez anos pela Europa, absorto em seus trabalhos científicos e aos 37 anos era um cientista conhecido e consagrado. Regressou a Portugal em setembro de 1800. Visitara, além dos países acima, a Dinamarca, a Bélgica, os Países Baixos, a Hungria, a Inglaterra e a Escócia.

[editar] Em Portugal

Dois meses depois de chegar a Portugal, partiu em novembro de 1800 para a Estremadura com seu irmão Martim Francisco Ribeiro de Andrada e Carlos Antônio Napion, encarregados de pesquisas mineralógicas sobre as quais escreveu uma Memória. Mal chegado da viagem, foi designado para nova comissão, examinar os pinhais reais dos Mêdos e Virtudes, nos terrenos de Almada e Sesimbra. Tornou-se dele admirador D. Rodrigo de Sousa Coutinho, conde de Linhares: eram parentes distantes e se tornaram amigos.

Ocupou a cátedra de Metalurgia, especialmente criada para ele na Universidade de Coimbra por Carta Régia de 15 de abril de (1801). Era obrigado a ali permanecer pelo prazo mínimo de seis anos. Foi nomeado Intendente-Geral das Minas e Metais do Reino, e membro do Tribunal de Minas, pela Carta Régia de 18 de Maio de 1801: deveria dirigir as Casas da Moeda, Minas e Bosques de todos os domínios portugueses. Por decreto de 8 de julho de 1801, recebeu o encargo de administrar as antigas minas de carvão de Buarcos e restabelecer as abandonadas fundições de ferro de Figueiró dos Vinhos e Avelar. Por decreto de 12 de novembro de 1801, foi feito diretor do Real Laboratório da Casa da Moeda de Lisboa e incumbido de remodelar o estabelecimento, pela Carta Régia de 1º de julho de 1802 recebeu o encargo de superintender e ativar as sementeiras de pinhais nos areais das costas marítimas; pelo alvará de 13 de julho de 1807, foi nomeado superintendente do rio Mondego e Obras Públicas de Coimbra. Mas pouco ou nada pode levar a cabo. Tinha a enfrentar a rotina portuguesa, em resistência «ora passiva a qualquer esforço renovador, ora ativa, insidiosa, mal dissimulando sentimentos subalternos de inveja ou despeito.» Lutou em vão contra o desleixo da Administração Pública. Não lhe facultaram jamais os recursos indispensáveis ao trabalho. Não desejou a cátedra e não se sentia com dons de professor. E em Coimbra a reforma de Pombal «não passara afinal de bons propósitos», segundo Octavio Tarquinio de Sousa, pois a universidade não possuía museu científico. Escreveu carta em 1806 ao conde de Linhares em que diz: « Estou doente, aflito e cansado e não posso com tantos dissabores e desleixos.Logo que acabe meu tempo em Coimbra e obtenha a minha jubilação, vou deitar-me aos pés de S.A.R. para que me deixe acabar o resto dos meus cansados dias nos sertões do Brasil, a cultivar o que é meu.»

Na Academia Real atingiria o cargo de Secretário perpétuo (1812). Sonhava com uma fábrica de aço e foi o responsável pela vinda para Portugal, e depois Brasil, de Guilherme von Eschwege, barão e mineralogista.

Integrou o grupo de intelectuais que se reunia em torno de Domenico Vandelli, partilhando a visão de que o domínio da natureza era capaz de gerar riquezas e que, portanto, necessitava ser conhecido e explorado científicamente.

À época da Guerra Peninsular, na repulsa à primeira invasão francesa em 1808 cuidou do fabrico de munições de guerra; na segunda invasão se revelou soldado: alistou-se em janeiro de 1809 num Corpo Militar Acadêmico comandado pelo professor de Matemática Tristão Silveira, teve o posto de major para combater Napoleão Bonaparte, alcançou a patente de tenente-coronel e depois comandante. Quando os franceses ameaçaram Lisboa, em outubro de 1810, recebeu ordens de reunir o Corpo e marchar para Peniche, onde ficou até a retirada do inimigo.

[editar] Retorno ao Brasil

Retornou ao Brasil em 1819, com 56 anos. Passara trinta anos na Europa. A colônia agora era reino unido e a sede da monarquia. Alguns dos velhos pecados continuavam, e o principal, a seus olhos, era a escravidão, pois o trabalhador era quase exclusivamente o negro e a economia se organizara em benefício de uma classe privilegiada. Apontaria imediatamente os pontos necessários a um extenso programa de trabalho: abolição do tráfico, extinção da escravidão, incorporação dos índios à sociedade, miscigenação orientada para suprimir choques de raças e de classes e de constituir uma ´nação homogênea´, transformação do regime de propriedade agrária com a substituição do latifúndio pela subdivisão de terras, preservação das matas e renovação das florestas, localização adequada das novas vilas, aproveitamento e distribuição das águas, exploração das minas... Mas, desde 1808 na terra, D. João VI jamais nomeara ministro um filho do país. Mortos o conde de Linhares em 1812, o conde da Barca e o Marquês de Aguiar em 1817, estando na Europa o conde de Palmela, os homens de maior valor na confiança real eram Tomás Antônio de Vila-Nova Portugal e o conde dos Arcos. José Bonifácio recusou os convites recebidos para como ajudante e partiu para Santos onde seu irmão Martim Francisco era diretor de minas e matas da Capitania de São Paulo (o outro irmão, Antônio Carlos, estava preso na Bahia, participante da revolução pernambucana de 1817). Reencontrou Eschwege e, como se correspondia com sábios de seu tempo,recebeu carta em que Humboldt lhe prometia uma visita no Brasil.

Com o irmão, fez «atentas pesquisas» durante cinco semanas em março de 1820 indo a Cubatão, à serra de Paranapiacaba, Ponte Alta, à Borda do Campo, São Paulo, ao pico do Jaraguá na serra da Cantareira, Parnaíba, Pirapora, Itu e Sorocaba, onde visitaram a fábrica de ferro (mal) administrada por Varnhagen, São Roque e Cotia. Estudou depois as salinas, a cargo do físico-mor João Álvares Fragoso.

D. João VI lhe deu por Carta de Mercê de 18 de agosto de 1820 título de conselheiro. Tudo inquiria e anotava, comenta Octavio Tarquinio de Sousa, « das questões básicas, como a do tráfico e da escravidão, às aparentemente menos importantes, como as que se referiam à alimentação e ao vestuário do povo, ou a certos costumes pouco recomendáveis. (....) Tudo interessava a José Bonifácio em sua terra e nenhum assunto lhe parecia trivial ou impróprio.»

Como mudar de atitude era próprio do caráter do rei, anulando o que prometera e cedendo a pressões de Portugal e a inquietação contínua, D. João VI embarcou para Portugal a 24 de abril de 1821, com quatro mil pessoas na comitiva. O Banco do Brasil se viu desfalcado de cinquenta milhões de cruzados. Ia começar a última fase da independência do Brasil e nela teria papel preponderante José Bonifácio.

[editar] O processo da Independência do Brasil

Ver artigo principal: Independência do Brasil.

Era difícil perceber o rumo no ano de 1821. A revolução portuguesa apresentava fachada liberal e expunha como objetivo o estabelecimento de um regime constitucional. Os brasileiros queriam também liberdade e constituição. Por isso, até se desmascararem os móveis verdadeiros da revolução portuguesa, houve confusão no Brasil, e aceitaram mandato de deputado a Lisboa indivíduos de cunho nativista, antes implicados em revoluções contra a metrópole. Descobriu-se mais tarde que a revolução portuguesa imporia, caso vitoriosa, a supremacia econômica e política da antiga metrópole. Diz Octavio Tarquinio de Sousa: «Era a reconquista, a volta em novos moldes e sob disfarces liberais, a um passado odioso, ao monopólio de exploração da colônia rica.»

Mas, enquanto isso, iam-se formando em todas as províncias juntas governativas provisórias. Em São Paulo, por bando de 12 de março de 1821, o governador e capitão-general João Carlos Augusto de Oyenhausen anunciou o regime constitucional. Para dar os primeiros passos, José Bonifácio aceitou convite para presidir à eleição dos membros, e propôs que fosse por aclamação. Indicou Oyenhausen como presidente do governo provisório, recebeu aclamação de seu próprio nome como vice-presidente, como um dos secretários (eram três, do Interior e Fazenda, da Guerra e da Marinha) foi indicado seu irmão Martim Francisco. Em 23 de junho de 1821 iniciava assim seu papel político no Brasil.

Enquanto as demais juntas governativas se deixavam atrair por Lisboa e viam o Rio de Janeiro com desconfiança, a Junta de São Paulo foi a primeira a reconhecer a autoridade do príncipe regente D. Pedro de Alcântara. Em carta de 17 de julho de 1821 ao pai, o Príncipe o menciona como o homem «a quem se deve a tranquilidade atual da província de São Paulo.» Foram eleitos seis deputados paulistas à Constituinte em Lisboa, entre eles Antônio Carlos, seu irmão, recém saído da prisão e que se revelaria grande orador, em Lisboa; o padre Diogo Antônio Feijó, mais tarde Regente; Nicolau Pereira de Campos Vergueiro, depois Senador e Regente em 1831. Os seis deputados receberam do governo instruções na forma de um documento coletivo, intitulado Lembranças e Apontamentos, programa completo em que as necessidades primordiais do Brasil eram postas em foco. A opinião pendia para a continuação do sistema vigente desde 1815, de reino unido, com igualdade de direitos políticos e civis. No documento estão as principais idéias de José Bonifácio. A parte mais desenvolvida dizia respeito do Brasil, em 12 itens: estabelecimento de um governo geral executivo, a cuja autoridade ficassem sujeitos os governos provinciais, definidos os limites da subordinação; a instrução pública, aumentando o número de escolas e criando pelo menos uma Universidade; o desenvolvimento do povoamento do interior; a a catequese e civilização dos índios ou seja sua integração; a emancipação gradual dos escravos e proibição do tráfico; a alteração da estrutura fundiária, com a reintegração ao domínio do poder público das terras improdutivas. Era assim contrário tanto à escravidão quanto ao latifúndio e nesse ponto chocou-se com os poderosos interesses dos grandes proprietários e dos traficantes. Outra sugestão foi a fundação de «uma cidade central no interior do Brasil», como efetivamente foi séculos depois realizado com Brasília, para assento do governo nacional; sugeria-se ainda uma nova legislação sobre o regime de terras, pois as chamadas sesmarias, verdadeiros latifúndios, eram uma forma de exploração antieconômica e anti-social; e os deputados foram advertidos para incentivar um novo surto de mineração. Nada do que se continha no documento seria aproveitado no trabalho das Cortes portuguesas. Dos 70 deputados brasileiros, apenas 50 chegaram a exercer mandato. O programa paulista era contrário ao que pretendiam as Cortes e, percebendo que o governo do Príncipe Regente no Rio seria o melhor instrumento de que poderiam servir-se os patriotas brasileiros, resolveram anulá-lo.

Em fins de maio de 1821 chegaram de Lisboa as bases da Constituição ali promulgada a 10 de março. A tropa portuguesa, que aderira à revolução do Porto e se tornara perturbadora da ordem, fez a 5 de junho um pronunciamento e obrigou D. Pedro, a princípio relutante, a jurar as bases. Era uma vitória reacionária, a continuação do antigo regime de subordinação. O trabalho subterrâneo da maçonaria recrudesceu então e nela se abrigaram os patriotas, aos quais se juntaria José Bonifácio e o próprio D. Pedro. O impulso definitivo para a emancipação brasileira foi dado pela obstinada política recolonizadora das Cortes. As medidas tomadas em Lisboa tinham o mesmo objetivo: desunir e desarticular o Brasil, fazê-lo novamente colônia. E o maior perigo, percebido por José Bonifácio, era o sacrifício da unidade brasileira. A Junta Governativa da Bahia, por exemplo, com predominância de interesses comerciais portugueses e forte presença de tropa lusa, recusava obediência ao Príncipe Regente e se subordinava a Lisboa e às Cortes. Em Pernambuco se esperava algo mais radical, a adoção de um governo republicano. À dispersão geográfica se somava o desentendimento político... Desde outubro de 1821 os patriotas do Rio de Janeiro queriam proclamar a independência do Brasil com o príncipe D. Pedro feito imperador. E este os advertiu do «delírio» que os empolgava e declarou-se pronto a morrer por «três divinais coisas - a Religião, o Rei, a Constituição.»

Em 9 de dezembro de 1821 porém chegaram ao Rio os textos dos últimos atos das Cortes que criavam «governos provinciais anárquivos e independentes mas sujeitos a Portugal», como diria José Bonifácio, e determinando o regresso quanto antes de D. Pedro para uma viagem, incógnito, aos reinos de Espanha, França e Inglaterra. Nada mais poderia manter a ilusão da continuidade do sistema de reino unido. As Cortes pretendiam anular a obra de S. João VI, fazendo de cada província brasileira uma província de Portugal.

O príncipe regente chegou a rascunhar um manifesto de despedida aos brasileiros. Mas já estava em curso uma ativa campanha, reuniões secretas da maçonaria, do clube da Resistência na casa de José Joaquim da Rocha. O príncipe foi mudando de atitude. Nas províncias, especialmente São Paulo e Minas Gerais, oa atos recolonizadores produziam reação idêntica à do Rio. Começaram a receber assinaturas para uma representação em que se pedia ao príncipe ficar no Brasil. Para José Bonifácio, chegara a hora das grandes decisões e de uma ação enérgica para que o Brasil não se esfacelasse. A carta do Governo de São Paulo ao Príncipe Regente, datada de 24 de dezembro de 1821, é de sua autoria. Diz Octavio Tarquinio de Sousa: «Se o tom é de violência, justificavam-na sua indignação e sua revolta, e era necessária para que D. Pedro sentisse claramente a disposição em que estavam os brasileiros de não mais se deixar dominar por Portugal.» Seu pedido ao Príncipe é quase uma ameaça: «É impossível que os habitantes do Brasil que forem honrados e se prezarem de ser homens, e mormente os paulistas, possam jamais consentir em tais absurdos e despotismos. V. A. Real deve ficar no Brasil quaisquer que sejam os projetos das Cortes Constituintes não só para nosso bem geral mas até para a independência e prosperidade futura do mesmo Portugal. Se V. A. Real estiver (o que não é crível) pelo deslumbrado e indecoroso decreto de 19 de Setembro, além de perder para o Mundo a dignidade de homem e de príncipe, tornando-se escravo de um pequeno número de desorganizadores, terá também que responder, perante o céu, do rio de sangue que decerto vai correr pelo Brasil.» A carta chegou às mãos do Príncipe no Rio a 1º de janeiro de 1822. Foi divulgada imediatamente por D. Pedro, contentíssimo, e mandada imprimir na Gazeta do Rio em 8 de janeiro. Em carta ao pai, de 2 de janeiro de 1822, D. Pedro escreve: «Farei todas as diligências por bem para haver sossego, e para ver se posso cumprir os decretos 124 e 125, o que me parece impossível, porque a opinião é toda contra, em toda a parte.»

[editar] O Fico e o resto do ano de 1822

D. Pedro no início de 1822 já tinha clara consciência do papel que os patriotas brasileiros lhe destinavam e estava disposto a desempenhá-lo. E no dia 9 de janeiro, quando José Clemente Pereira, presidente do Senado da Câmara do Rio, lhe entregou a representação fluminense, tentou adiar a resposta mas acabou declarando: ´Como é para o bem de todos e felicidade geral da nação, estou pronto: diga ao povo que fico!.

Por sua vez, José Bonifácio chegou ao Rio a 17 de janeiro na representação paulista. Foi nessa ocasião que se entreteve na fazenda de Santa Cruz com a princesa D. Leopoldina de Habsburgo. O Príncipe, de 23 anos, o nomeou, aos 60 anos, seu ministro do Reino e dos Estrangeiros - o primeiro brasileiro a ocupar um cargo semelhante. Diz Octavio Tarquinio de Sousa: «Não estava mais em idade de contentar-se com a simples aparência das coisas, nem o enganavam palavras, por mais prestigiosas que fossem.» Suas idéias estavam esboçadas nas Instruções feitas para os deputados paulistas às Cortes, e atacavam os problemas sociais e econômicos. Queria uma organização democrática, queria governo responsável, sistemas representativos, garantias constitucionais. Mais importante que tudo era a preservação da ordem pública - pois a tropa portugussa se passara para Niterói.

A 21 de janeiro, ordenou ao desembargador do paço chanceler-mor que não mais fizesse a repartição das leis vindas de Portugal sem antes as submeter ao Príncipe Regente. E a 30 de janeiro de 1822, concitava os governos provisórios de todas as províncias a promoverem a união das mesmas «com sujeição à regência» de D. Pedro. Decreto de 22 de fevereiro de 1822, referendado por José Bonifácio, convocou a Junta de Procuradores das províncias. Já começava a ter problemas com certo grupo de políticos do Rio de Janeiro: apareciam a seus olhos como demagogos e agitadores que só queriam precipitar os acontecimentos Joaquim Gonçalves Ledo, Januário da Cunha Barbosa, José Clemente Pereira.

A José Bonifácio se deve seguramente a adesão de D. Pedro ao movimento emancipador. E sua orientação foi fundamental para que este se desse sem transbordamentos inúteis, sem choques. Como medida preliminar, entendia-se necessária a união das províncias - mas no Pará, na Bahia, no Maranhão,não faltava quem quisesse continuar na dependência das Cortes. A posição de Pernambuco parecia-lhe ambígua. Sua primeira atitude foi assegurar a adesão efetiva de Minas Gerais e por isso fez o Príncipe Regente viajar para lá. Essa viagem serviu para «uma radical transformação de ânimo» em D. Pedro, «de lhe ter completado a naturalização de brasileiro». Em sua ausência, por decreto de 23 de março de 1822 cabia a José Bonifácio como Ministro do Reino a chefia do governo.

Nos primeiros meses os dois se entenderam tão bem, de modo íntimo e sem etiquetas, que D. Pedro vinha vê-lo para despachar em sua casa no Largo do Rossio. Com isso, despertaram ciúmes no grupo de patriotas cariocas, que desejavam influência, entrar para o governo, manejar o poder. Esse grupo, ativo na maçonaria do Rio, foi o indutor de que o título de « protetor e defensor perpétuo do Brasil» fosse oferecido a D. Pedro, e a 13 de maio de 1822, dia de gala e beija-mão do povo por ser o do aniversário do rei D. João VI, D. Pedro aceitou ser aclamado «defensor» mas disse que «o Brasil não precisava de sua proteção e a si mesmo se protegia». A iniciativa foi tomada à revelia de José Bonifácio.

O problema seguinte do Ministro do Reino foi a convocação de uma Assembléia Constituinte, idéia de todos os patriotas - e desde 3 de abril de 1822 carta do Príncipe Regente a José Bonifácio a considerava «o único açude que possa conter uma corrente tão forte.» José Bonifácio não seria em princípio contrário, mas hesitava decerto acerca de sua oportunidade. Preferia antes assegurar a unidade nacional, firmar a solidariedade das províncias, temia o que chamava «as desordens das Assembléias Constituintes.» Mas as Cortes continuavam em seu propósito de fazer o Brasil voltar à situação colonial e o grupo de políticos do Rio que fazia da maçonaria seu centro sentia a necessidade de uma ação imediata. Fze-se uma representação a D. Pedro em 23 de maio para que a convocasse sem demora. Dois dias antes o Príncipe Regente escrevia ao pai: «As leis feitas tão longe de nós por homens que não são brasileiros e não conhecem as necessidades do Brasil não poderão ser boas». Mas ao receber a representação teve palavras moderadas, dilatórias, que devem ter-lhe sido inspiradas por José Bonifácio. Mas no Rio não escasseavam os elementos reacionários (chamados pés de chumbo, gente do comércio e traficantes de escravos), o que estimulava ardores nativistas e favorecia mesmo o surto de idéias radicais, nitidamente republicanas ou democráticas puras. Ganhava mais do que nunca ascendente a maçonaria, o grupo de Gonçalves Ledo à frente, os quais José Bonifácio considerava sôfregos agitadores...

A 1º de junho o Príncipe Regente baixou uma proclamação em que falava da pátria ameaçada e marcava para 2 de junho a reunião do Conselho dos Procuradores-Gerais das províncias, para saber o que pensava da Constituinte - e em 24 horas o Conselho lhe enviou um requerimento em que pedia a convocação! A 3 de junho de 1822 foi expedido decreto em que José Bonifácio convocou a Assembléia Geral Constituinte e Legislativa, no qual ainda se falava em manter a integridade da monarquia portuguesa e a união com Portugal. Mas a 15 de junho foi dado outro passo rumo à ruptura com Portugal, pois José Bonifácio comunicou ao cônsul inglês que mandava admitir nas alfândegas os navios britânicos, independente do certificado do consulado de Portugal em Londres, até que fosse nomeado um cônsul do Brasil naquela cidade - desde 24 de maio estava nomeado um cônsul brasileiro em Buenos Aires. Pernambuco aderiu rapidamente ao Príncipe Regente mas na Bahia a situação continuava séria e a 15 de junho D. Pedro enviou carta em que mandava o General Madeira embarcar sem demora para Portugal. Foim necessário enviar uma expedição contra ele, e como comandante José Bonifácio indicou o general francês Pedro Labatut.

Enquanto isso em São Paulo ocorria o golpe que se chamou a bernarda de Francisco Inácio, do qual entretanto saíram fortalecidos os Andradas, e Martim Francisco foi nomeado a 4 de julho de 1822 Ministro da Fazenda, passando Caetano Pinto de Miranda Montenegro para a recém criada pasta da Justiça. As finanças estavam em estado caótico - o novo ministro foi, como em São Paulo, inflexível com os devedores do Erário, em regra os poderosos da terra, habituados a não recolherem aos cofres o que deviam. A oposição aos irmãos só podia crescer...

Em fins de julho chegaram ao Rio notícia de que as insensatas Cortes de Lisboa enviavam numerosa tropa para dominar o país. José Bonifácio já se entendia melhor com Ledo e com os membros mais destacados do Grande Oriente, sobretudo com o general Luís Pereira da Nóbrega de Sousa Coutinho, nomeado ministro da Guerra desde 27 de junho de 1822. Tomou medidas da maior gravidade, como a de declarar inimigas tropas que Portugal mandasse para o Brasil por meio do decreto de 1º de agosto em que D. Pedro se dava como «regente do vasto Império do Brasil pelo consentimento e espontaneidade dos povos» e, a bem dizer, declarava guerra a Portugal. O decreto e o Manifesto que o acompanhava eram já sinal da decisão tomada: a ruptura completa. Mas eram atos dirigidos ao povo brasileiro. José Bonifácio como ministro dos Estrangeiros preparou o arrazoado das razões em que se baseava o Príncipe para ser levado aos demais povos. É ele o autor do documento de 6 de agosto de 1822: extenso, imoderado, de linguagem por vezes inconviente, «um longo, maciço, implacável artigo de combate e demolição», nas palavras de Octavio Tarquinio de Sousa, onde expunha o legítimo ressentimento por três séculos de dominação, e avisava ao mundo que os brasileiros não mais admitiriam a volta ao regime anterior.

Na cópia enviada a 14 de agosto de 1822 ao corpo diplomático acreditado no Rio José Bonifácio explica a posição do Brasil: «Tendo o Brasil, que se considera tão livre quanto o reino de Portugal, sacudido o jugo da sujeição e da inferioridade com que o reino irmão o pretendia escravizar, e passando a proclamar solenemente a sua independência e a exigir uma assembléia legislativa dentro do seu próprio território, com as mesmas atribuições que a de Lisboa...» Desde 12 de agosto estavam nomeadom Felisberto Caldeira Brant Pontes (o futuro marquês de Barbacena) encarregado de negócios junto ao Governo britânico, Manuel Rodrigues Gameiro Pessoa para Paris e Luís Moutinho para Washington. Em suas instruções redigidas por José Bonifácio, o item principal era a independência do Brasil.

[editar] A declaração de Independência

O Príncipe Regente a 14 de agosto de 1822 partiu para São Paulo, cujo governo reacionário parecia querer desacatar José Bonifácio. Tivera antes sucesso em sua missão a Minas, repetiria o êxito em São Paulo. Foi bem recebido e, «com a autoridade que suas estroinices e desmandos só mais tarde diminuiriam», pôs ordem no governo provincial. Em sua ausência ficara como regente sua mulher, a princesa D. Leopoldina de Habsburgo, colaboradora da obra de José Bonifácio. Tinha poderes para, em Conselho de ministros, tomar com o mesmo as medidas necessárias «ao bem e à salvação do Estado».

Ora, no fim de agosto chegaram ao Rio três navios de Lisboa com notícias de que as Cortes tinham decidido reduzir o príncipe a simples delegado temporário e apenas nas províncias onde exercia autoridade, com ministros vindos de Lisboa; haviam anulado a convocação do Conselho de Procuradores e mandaria processar todos quantos tivessem procedido contra sua política. O visado era José Bonifácio, tido como o maior responsável pelos acontecimentos. Este recebeu ao mesmo tempo carta de seu irmão Antônio Carlos, em Lisboa. E escreveu a D. Pedro: «0 dado está lançado e de Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores. Venha V.A. quanto antes e decida-se, porque irresoluções e medidas d´água morna, à vista desse contrário que não nos poupa, para nada servem e um momento perdido é uma desgraça». Com sua carta seguiram cartas de D. Leopoldina, incitando o marido ao gesto, uma de Antônio Carlos, outra do inglês Chamberlain.

O emissário, Paulo Emílio Bregaro, encontrou D. Pedro que voltava de Santos, leu os papéis, demonstrou sua grande indignação, e ao encontrar a Guarda de Honra que o esperava nas margens do riacho Ipiranga, comunicou que as Cortes queriam ´massacrar´ o Brasil. Eram quatro e meia da tarde de 7 de setembro de 1822 e o príncipe, num verdadeiro brado, exclamou: « É tempo! Independência ou morte! Estamos separados de Portugal.»

[editar] O fim do ano 1822: aclamação e tumultos

D. Pedro, mesmo ligado a José Bonifácio, vinha sofrendo o assédio do grupo de Gonçalves Ledo, apontado como representante genuíno do sentimento popular. Isto prova sua entrada para a maçonaria e nomeação como grão-mestre do Grande Oriente, a 20 de agosto de 1822mesmo , rebaixando-se José Bonifácio a grão-mestre adjunto. No dia de sua chegada de São Paulo, D. Pedro foi tomar posse de seu cargo. Não desejaria abandonar José Bonifácio, mas sim, tendo criado fé em seu destino, ganhara confiança em si mesmo e teria o intento de ouvir outras opiniões. Em setembro e outubro de 1822 D. Pedro parece ter oscilado mais que nunca, com seu temperamento nervoso, de um lado entre os patriotas da maçonaria, querendo tudo e disputando a primazia, e do outro José Bonifácio, procurando chegar aos mesmos fins mas sem demagogia nem precipitações.

Este grupo da maçonaria preparou outra ação política importante, a da Aclamação de D. Pedro I, a 12 de outubro de 1822, como imperador constitucional do Brasil. Estipulava-se uma cláusula do juramento prévio que o novo imperador deveria prestar à Constituição a ser redigida pro uma Assembléia Constituinte. A essa cláusula José Bonifácio se opòs terminantemente e foi ela a razão de seu rompimento com o grupo de Gonçalves Ledo. Mas «depois que D. Pedro se desmandou, dissolveu a Constituinte, passou a exibir uma concubina, criou tribunais de exceçãp, fez morrer patriotas na forca, exilou e manteve José Bonifácio no exílio durante seis anos e, mais do que tudo para os ´democratas´, outorgou uma Constituição que não cumpriu, Lego não figurou entre os liberais que se opuseram ao imperador e José Clemente foi ministro submisso e tido por absolutista.»

José Bonifácio, confirmado Ministro do Interior e dos Negócios Estrangeiros, foi tomando providências no novo governo. Por decreto de 18 de setembro, descreveu as armas e a bandeira brasileira como se mantiveram até 1889. Por outro decreto também de 18 de setembro, criou o tope nacional brasileiro, verde e amarelo. Noutro, concedia anistia geral para todas as passadas opiniões políticas - mas excluindo dos benefícios aqueles que se achassem presos e em processo. Pediu por primeira vez demissão quando Ledo inspirou ao Imperador um decreto mandando cessar a devassa em São Paulo...

O momento era grave, pois a Bahia, o Maranhão e o Pará continuavam fora da comunidade nacional e havia perigo de uma reação armada de Portugal. José Bonifácio queria a aclamação de D. Pedro como imperador mas queria também um Poder Executivo forte que assegurasse a ordem, terminasse a tarefa de unir as províncias. Temia as assembléias constituintes...Na véspera da aclamação, José Bonifácio já teria retomado seu ascendente sobre D. Pedro e a 12 de outubro D. Pedro I foi aclamado imperador constitucional do Brasil em meio a grandes festas mas sem a cláusula do juramento prévio.

A apreciação de numerosos historiadores é que, sem ele no Governo, «a unidade do Império teria sido preservada com dificuldades muito maiores, e o Brasil, dividido e dilacerado, não escaparia provavelmente aos transes do caudilhismo e da tirania militar.»

Mas houve choques com os irmãos Andrada, o problema da Maçonaria avultou e, a 28 de outubro de 1822, D. Pedro organizou novo Gabinete em que José Bonifácio foi substituído pelo barão de Santo Amaro, seu velho companheiro em Coimbra, na secretaria do Império e Estrangeiros; Martim Francisco na Fazenda pelo desembargador João Inácio da Cunha. José Joaquim da Rocha iniciou um movimento pela volta dos Andradas ao poder, intenso trabalho de propaganda, sessões tumultuosas no Senado da Câmara, manifestações populares - e José Bonifácio voltou, reintegrado a seu posto, por decreto de 30 de outubro de 1822. Repressão excessiva de sua parte, vieram medidas rigorosas, fechamento da maçonaria, exílios, partindo para o Havre em 20 de dezembro de 1822 José Clemente Pereira, o cônego Januário, Pereira da Nóbrega. Gonçalves Ledo conseguiu fugir para Buenos Aires. Chamou-os todos, em portaria de 11 de novembro, «furiosos demagogos e anarquistas».

José Bonifácio, Ministro do Império a quem cabia portanto dirigir a política interna, e Ministro dos Estrangeiros, ainda foi o responsável pela criação de uma Marinha de guerra, tendo Caldeira Brant lhe enviado de Londres cerca de 400 marinheiros e oficiais ingleses postos à disposição do audacioso Cochrane, ávido lobo-do-mar sem muitos escrúpulos, conde de Dundonald, feito mais tarde Marquês do Maranhão, e que se encontrava no Chile, cuja marinha servia. Medida de guerra foi ainda o decreto de 11 de dezembro de 1822 em que José Bonifácio ordenou o sequestro de todas as mercadorias nas alfândegas do Império de propriedade de portugueses, as que estivessem em mãos destes, os prédios rústicos e urbanos, as embarcações pertencentes a súditos de Portugal. Outro decreto de 30 de dezembro de 1822 elevou para 24% os direitos de importação de mercadorias portuguesas, equiparadas assim às dos demais países do mundo, salvo as da Inglaterra que, por força do tratado de 1810, continuavam a pagar 15%.

Ele, que não usava escravos em suas propriedades, escrevera ao mesmo Caldeira Brant desde outubro de 1822, pedindo para o Brasil trabalhadores rurais ingleses, para estabelecê-los no Brasil. Vieram cerca de 250, como a 16 de janeiro de 1823 comunicou Caldeira Brant, inicialmente pelo navio Lawpin.

[editar] A Assembléia Constituinte: 1823

1823 é o grande ano da Constituinte. Um decreto de 14 de abril fixou para 17 do mesmo mês e ano a primeira reunião preparatória, a 3 de maio a abertura definitiva. A opinião de José Bonifácio estava expressa na frase que D. Pedro I pronunciou em sua coroação, na cerimônia pomposa e teatral em 1º de dezembro de 1822: «Com a minha espada defenderei a pátria, a nação e a Constituição, se for digna do Brasil e de mim.» Era a advertência aos deputados, como o resto de sua Fala, a que não perpetrassem apenas uma obra de teóricos e sonhadores. Para José Bonifácio, o mandato dos constituintes não era irrestrito, a forma de governo fora predeterminada: uma monarquia constitucional.

Num Brasil com um milhão de escravos numa população total inferior a quatro milhões, mal saído da opressão colonial, sem escolas, sem universidades, em que até 15 anos atrás não se admitia a existência de um prelo, de um jornal, a Assembléia congregava muitos homens de valor - mas todos inexperientes em assuntos de técnica parlamentar e legislativa. A posição do governo se tornou menos cômoda. Surgiram logo os protestos liberais, o governo mantinha gente nas prisões sem culpa formada, ordenava deportações, coagia a imprensa. Formou-se na Constituinte uma oposição aguerrida e José Bonifácio não possuía os dons necessários de convencimento, era mau orador, com timbre de voz antipático, não se preocupava em ser amável, não disfarçava certo tom arrogante. «Por não ser mais sereno, carrega hoje culpas que não lhe cabem», conclui Octavio Tarquinio de Sousa, como o atentado de que foi vítima o jornalista Luís Augusto May. Enquanto isso D. Pedro passou a acreditar em todos elogios, em todos os louvores, acreditando-se o herói único, autor exclusivo da independência.

José Bonifácio caiu após um episódio que envolveu o padre Francisco Muniz Tavares, deputado por Pernambuco, sobre a situação dos portugueses no Brasil. O projeto de deportação não vingou, mas deu ensejo a que se dissesse o que não deveria ter sido dito. O imperador decidiu afastar seu ministro e demiti-lo por uma questiúncula de política regional paulista. José Bonifácio se considerou demitido na noite de 15 de julho de 1823. Seu substituto foi José Joaquim Carneiro de Campos, depois Marquês de Caravelas. Solidária, demitiu-se também sua irmã Maria Flora Ribeiro de Andrada das funções de camareira-mor da imperatriz.

Em uma entrevista dada em 5 de setembro de 1823 a O Tamoio, jornal por ele fundado em agosto de 1823 após sua demissão do Governo em 16 de julho de 1823, que lhe refletia sempre as idéias e só viveu três meses, explica suas idéias, abre seu coração. O homem público estava intacto, cheio de interesse pela política. Não podia afastar-se da Corte, pois era deputado à Constituinte, mas lutaria contra o que não lhe agradava. A 1º de setembro de 1823 foi lido o projeto de Constituição, com 272 artigos, do qual Antônio Carlos, seu irmão, era o relator e autor principal. Era francamente liberal, e criava um poder executivo forte, delegado ao imperador. Mas havia no seio da Assembléia já quatro ou cinco grupos. E em Portugal um golpe absolutista contra as desastradas Cortes investira novamente D. João VI na plenitude dos poderes do Estado. Portugueses e reacionários começavam no Brasil a levantar a cabeça. O imperador ia aos poucos cedendo, o elemento militar luso, infiltrado no exército, se tornava perigoso e insolente. A campanha dos que se intitulavam os patriotas continuava, nacionalista e antiportuguesa. Houve discursos de grande exaltação, em novembro de 1823, depois do episódio com Davi Pamplona Corte Real. O Imperador refez então seu Gabinete com gente incolor ou reacionária. Novo ministro do Império foi escolhido Francisco Vilela Barbosa, chegado há pouco de Portugal, depois Marquês de Paranaguá. A tropa passou a exigir restrições à liberdade de imprensa e a expulsão dos Andrada da Assembléia. A dissolução da Constituinte era inevitável.

José Bonifácio foi preso em casa e levado para a fortaleza da Laje, após o golpe de força da dissolução da Assembléia pelo Imperador, em 12 de Novembro de 1823. Não haveria nova Constituinte - D. Pedro I outorgaria uma Constituição a 24 de março de 1824. Deixou o Rio de Janeiro numa velha charrua a 20 de novembro de 1823 comandada pelo português Joaquim Estanislau Barbosa, com destino ao Havre. Chegaram a Vigo a 12 de fevereiro e quase foram apresados p+or navios portugueses, escapando graças a aviso do cônsul da França, que o procurou a bordo. Seguiram por terra para Corunha e de barco para Bordéus, onde desembarcaram a 5 de julho!

[editar] Exílio e retorno

Banido, foi residir em Talence, a quatro quilômetros de Bordéus, com sua família mais chegada. Viveria no exílio dos 61 aos 66 anos. Martim Francisco e Antônio Carlos moravam também em Bordéus. Renasceu nele o trabalhador intelectual, o homem de estudos. E a «solidão do campo», como escreveu a amigos, lhe trouxe «a mania antiga de poeta». Traduziu Virgílio e Píndaro, compôs e em 1825, sob o pseudônimo arcádico de Américo Elísio, publicou em Bordéus as Poesias avulsas, gastando nisso 500 francos. Não era bom poeta, nem poeta original. Era homem bem marcado pela segunda metade do século XVIII.

As notícias do Brasil não o podiam deixar contente. D. Pedro I a 25 de março de 1824 outorgada a Carta Constitucional, fora implacável ao abafar o movimento revolucionário do Nordeste conhecido como Confederação do Equador, nascido da dissolução da Assembléia, armara cadafalsos. Preocupavam-no sobretudo as negociações para o reconhecimento da independência, com Portugal e a Inglaterra, que se arrastaram até agosto de 1825. O fato de o Brasil aceitar pagar dois milhões de esterlinas a Portugal lhe pareceu mais uma carta de alforria do que o reconhecimento... Foi impiedoso com D. Joâo VI: «Que galantaria jocosa de conservar João Burro o título nominal de imperador e ainda mais nisso convir o P. Malasastes!» Que D. Pedro tivesse feito á michela Domitila´, como a chamava, Viscondessa de Santos, justamente a cidade onde nascera, lhe pareceu «um insulto desmiolado». Continuou proscrito - e perseguido. Para o Brasíl é que sonhava voltar.

Em maio de 1826 foi instalada a primeira Assembléia Legislativa brasileira. D. Pedro I não agiu imparcialmente na escolha dos senadores, nem se deveria esperar isso dele. Morreu o velho rei D. João VI e D. Pedro lhe sucedera no trono português, outorgando uma Carta, decretando anistia geral e abdicando em favor de sua filha D. Maria da Glória, futura D. Maria II. Enquanto isso a devassa aberta contra os Andradas se eternizava em São Paulo, avançando até 1828. Ele permanecia em Bordéus, que chamava «vinhosa cidade, urinol do mundo». Neste período foi duas vezes votado como deputado pela Bahia. Antônio Carlos e Martim Francisco conseguiram autorização para o regresso: deixaram Bordéus a 26 de abril de 1828, foram recolhidos à fortaleza da ilha das Cobras no Rio a 4 de julho e a 6 de setembro de 1828 lograram absolvição e liberdade.

Em 1829 lhe foi permitido retornar ao Brasil. Chegou ao Rio de Janeiro a 23 de julho, carregando o cadáver da esposa, morta na viagem. O ministro do Império era seu adversário José Clemente Pereira, o dos Estrangeiros o marquês de Aracati, Oyenhausen, seu companheiro no governo provisório de São Paulo e depois também adversário. A situação política não era das melhores. O imperador não se entendia com o Poder Legislativo, não escolhia ministros que desfrutassem do apoio dos deputados, entre os quais havia quem quisesse estabelecer o parlamentarismo à inglesa. O Primeiro Reinado vinha se caracterizando por uma constante instabilidade política e social. José Bonifácio teria grandes dúvidas sobre a campanha liberal dirigida por Bernardo Pereira de Vasconcelos, Evaristo da Veiga e outros. Generoso, perdoava ao que chamava por vezes o Rapazinho, e D. Pedro o recebeu com alegria. Com o marquês de Barbacena, que desembarcara no Rio em 16 de outubro de 1829 trazendo a nova imperatriz D. Amélia de Leuchtenberg, sempre se entendera bem. Mas seus inimigos não o deixavam descansar e já em março de 1830 foi acusado de estar metido em uma conspiração republicana, como insinuou o Diário Fluminense. Vivia então retirado em Paquetá.

[editar] Tutor dos príncipes

Com a abdicação de D. Pedro I e (1831), foi por ele nomeado tutor de seu filho de cinco anos, o futuro D. Pedro II. Mau marido, o imperador foi «um pai dedicado e enternecido - e de todos os filhos, legítimos ou não». O imperador assinou um decreto em que nomeava «tutor dos meus amados e prezados filhos ao muito probo, honrado e patriótico cidadão José Bonifácio de Andrada e Silva, meu verdadeiro amigo.» No dia 8 de abril, José Bonifácio foi ao palácio da Boa Vista visitar os pupilos. Tinha 68 anos e «seu temperamento e seu feitio não prometiam um tutor ideal.» Ainda apareceria na Câmara dos Deputados (suplente de Honorato José de Barros Paim). Prestou juramento perante o Senado como tutor eleito pela Assembléia a 19 de agosto de 1831. A lei de 12 de agosto de 1831 regulava suas funções. Não lhe cabia senão nomear mestres e mordomos. Manteve Luís Aleixo Boulanger para lhes ensinar escrita, primeiras letras e geografia; o cônego Renato Pedro Boiret para mestre de francês; Simplício Rodrigues de Sá, de desenho; Lourenço Lacombe, de dança; Fortunato Mazzioti, de música. Acabou brigando com D. Mariana Carlota de Verna Magalhães Coutinho, a quem os príncipes consideravam uma segunda mãe, e que não teria pequena parte na campanha movida contra ele.

Logo se tornou suspeito ao governo. O grande ministro da Justiça, Diogo Antônio Feijó, que abafara dois graves levantes armados no Rio em 1831 e 1832, se convenceu de que tivera parte no último e o acusou formalmente. Em 1833 o grande temor era a volta de D. Pedro I, a restauração, um golpe caramuru. Antônio Carlos fora mesmo à Europa para convencê-lo a retornar. A Aurora Fluminente de Evaristo da Veiga acusava o tutor de falta de compostura, comentando dois bailes dados no Paço. Afinal, foi suspenso do cargo pelo decreto de 14 de dezembro de 1833, por ato cujo verdadeiro autor era o ministro da Justiça, Aureliano Coutinho, depois visconde de Sepetiba, que escreveu a D. Mariana de Verna: «Parabéns, minha senhora. Custou, mas demos com o colosso em terra.»

Estavam enganados: José Bonifácio resistiu, em louca energia, a diversos juízes de paz que foram ao Paço levar seu decreto de suspensão, pois não o considerava legal. E escreveu ao ministro do Império: «Cederei à força, que não a tenho.» Para arrancá-lo, mobilizou-se a tropa e foi lavrada contra ele ordem de prisão. O governo prendeu-o em casa, na ilha de Paquetá. Em seu lugar foi nomeado o marquês de Itanhaém, «de cabeleira postiça e idéias nada originais, em cuja mediocridade acomodada todos os medíocres se reveriam como num espelho fiel.»

[editar] O fim

Abandonou a vida política e passou o restante de seus dias em reclusão em sua casa na ilha, dentro da Baía de Guanabara. Morreu ali perto, em Niterói, a 6 de Abril de 1838, aos 75 anos. Seu cadáver, embalsamado, foi levado três dias depois para o Rio de Janeiro, depositado na Igreja da Ordem Terceira da Nossa Senhora do Carmo, onde ficou exposto até o dia 25 de abril. Nessa data sua filha D. Gabriela Frederica Ribeiro de Andrada o levou para Santos, sepultando-o na capela-mor da Igreja Nossa Senhora do Carmo, segundo disposição testamentária.

Deixou poucos bens. Fora e continuava a ser homem pobre. Mas sua livraria contava seis mil volumes.

Atualmente, os seus restos mortais jazem ao lado dos despojos de seus ilustres irmãos, Antônio Carlos, Martim Francisco e o padre Patrício Manuel, num monumento situado em Santos, na Praça Barão do Rio Branco 16, denominado Panteon dos Andradas, inaugurado no dia 7 de Setembro de 1923.

Como poeta usou o pseudônimo de Américo Elísio.

[editar] Casamento e posteridade

Casou em Lisboa, em 31 de janeiro de 1790, na igreja de N. S. da Lapa, com uma senhora irlandesa, Narcisa Emilia O'Leary, que lhe deu duas filhas.

  • 1 - Carlota Emília, que casou com Alexandre Antônio Vandelli, auxiliar do sogro desde 1813 na Intendência-Geral das Minas e Metais e na Academia das Ciências.
  • 2 - Gabriela Frederica de Andrada que em 15 de novembro de 1820 casou em Santos com seu tio, Martim Francisco Ribeiro de Andrada.
  • 3 - voltando ao Brasil, trouxe uma filha bastarda, batizada, em homenagem à esposa, Narcisa Cândida.

[editar] Representações na cultura

José Bonifácio já foi retratado como personagem no cinema e na televisão, interpretado por Dionísio Azevedo no filme "Independência ou Morte" (1972), Leonardo Villar na novela "Marquesa de Santos" (1984), e Paulo Goulart na minissérie "O Quinto dos Infernos" (2002).

[editar] Obras

  • 1813 Sobre as minas de carvão-de-pedra em Portugal, publicado no Patriota, Rio de Janeiro, 1813.
  • 1813, memória Há terrenos que pelo arado não dão fruto, mas sendo cavados com o picão sustentam mais do que se fossem férteis. Publicada no Patriota, Rio de Janeiro, 1813.
  • 1814 Experiências Químicas sobre a quina do Rio de Janeiro, comparada com outras.
  • 1814-1815 - Memória minerográfica da serra que decorre de Santa Justa até Santa Comba e suas vizinhanças na província do Minho (Museu Paulista, Coleção José Bonifácio, Doc. 290).
  • 1815 - Sobre a necessidade e utilidade do plantio de novos bosques em Portugal, particularmente de pinhais nos areais de beira-mar; seu método de sementeira, custeamento e administração.
  • 1816 - A Primavera.
  • 1817 - Memória sobre a nova mina de ouro da outra banda do Tejo, chamada Príncipe Regente.
  • 1818 - Memória sobre as pesquisas e lavra dos veios de chumbo de Chacim, Souto, Ventozello, e Villar de Rey na província de Trás-os-Montes.
  • 1820 - Memória Econômica e Metalúrgica, sobre a fábrica de ferro em Sorocaba, que visitaria por segunda vez em 1821, com duras críticasà «má administração antiga e nova», aos «abusos e ladroeiras» - o que iria suscitar a má vontade, a ira, a vingança do filho do diretor, o grande historiador Varnhagen, filho de seu Diretor.
  • 1825 - Poesias Avulsas
  • s/d - Memória minerográfica sobre o distrito metalífero entre os rios Alva e Zêzere (Museu Paulista, Coleção José Bonifácio, Doc. 291.)

[editar] Ver também

  • FALCÃO, Edgar Cerqueira de (org.). Obras científicas, políticas e sociais de José Bonifácio de Andrada e Silva (1963).
  • SOUSA, Octávio Tarquinio de. História dos fundadores do Império do Brasil. Vol. 1. Livraria José Olympio Editora, 2ª edição, revista.
  • SOUSA, Alberto. Os Andradas. Typographia Piratininga, São Paulo (1922).
  • COELHO, José Maria Latino. Elogio Histórico de José Bonifácio, Edições Livros de Portugal, Rio de Janeiro (1942).

[editar] Links externos


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