Leishmaniose
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A leishmaniose ou leishmaníase ou calazar é a doença provocada pelos parasitas unicelulares do género Leishmania. Há três tipos de leishmaníase: visceral, que ataca os orgãos internos, cutânea, que ataca a pele, e mucocutânea, que ataca as mucosas e a pele. No Brasil existem as três formas, enquanto que em Portugal existe principalmente a leishmaníase visceral e alguns casos (muito raros) de leishmaníase cutânea. As Leishmania são transmitidas pelos mosquitos fêmeas dos géneros Phlebotomus (Velho Mundo) ou Lutzomyia (Novo Mundo).
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[editar] Leishmania
- Reino: Protista
- Filo: Euglenozoa
- Classe: Kinetoplastea
- Ordem: Trypanosomatida
- Género: Leishmania
As Leishmania são protozoários que são parasitas de células fagocitárias de mamíferos, especialmente de macrófagos. São capazes de resistir à destruição após a fagocitose. As formas promastigotas (infecciosas) são alongadas e possuem um flagelo locomotor anterior, que utilizam nas fases extracelulares do seu ciclo de vida. O amastigota (intra-celular) não tem flagelo.
Há catorze espécies patogénicas para o ser humano. As mais importantes são:
- As espécies L. donovani, L. infantum, e L. chagasi que podem produzir a leishmaniose visceral, mas, em casos leves, apenas manifestações cutâneas.
- As espécies L. major, L. tropica, L. aethiopica, L. mexicana, L. braziliensis e L. peruviana que produzem a leishmaniose cutânea ou a mais grave, mucocutânea.
[editar] Ciclo de vida
O ciclo de vida das espécies é ligeiramente diferente mas há pontos comuns. São libertados no sangue pela picada de dois géneros atípicos de mosquitos (noutras línguas como inglês nem são denominados mosquitos, mas antes sandflies): Lutzomyia e Phlebotomus. As leishmanias na forma de promastigotas ligam-se por receptores específicos aos macrófagos, pelos quais são fagocitadas. Elas são imunes aos ácidos e enzimas dos lisossomas com que os macrófagos tentam digeri-las, e transformam-se nas formas amastigotas após algumas horas (cerca de 12h). Então começam a multiplicar-se por divisão binária, saindo para o sangue ou linfa por exocitose e por fim conduzem à destruição da célula, invadindo mais macrófagos. Os amastigotas ingeridos pelos insectos transmissores demoram oito dias ou mais a transformarem-se em promastigotas e multiplicarem-se no seu intestino, migrando depois para as probóscides.
[editar] Epidemiologia
Os parasitas são transmitidos pela picada dos mosquitos Phlebotomus no velho mundo e Lutzomyia no novo. Em Portugal a leishmaníase visceral por L. infantum não é rara, sendo transmitida por Phlebotomus perniciosus e Phlebotomus ariasi.
- Leishmaniose principalmente visceral (organismos mais agressivos):
- A L. donovani é a mais frequente causa de leishmaniose visceral. Em algumas regiões (Índia e Sudão) encontra-se uma forma de leishmaniose dérmica pos-kalazar (PKDL). É transmitida por Phlebotomus e existe no subcontinente indiano e na África equatorial (rara em Angola e Moçambique). O reservatório são os seres humanos e os cães.
- A L. infantum provoca uma variante menos grave da leishmaniose visceral e existe na região mediterrânica, incluindo países do Norte de África, Turquia, Israel, Grécia, Itália, sul da França, Portugal e Espanha e ainda nos Balcãs, Irão, algumas regiões da China e Ásia central. É transmitida pelo Phlebotomus e o seu reservatório são os cães, lobos e raposas. Em Portugal é mais frequente em regiões como Trás-os-Montes, Coimbra e a Beira Litoral, Algarve e na região dos estuários dos rios Sado e Tejo.
- A L. chagasi existe na América Latina, incluindo Brasil. O insecto transmissor é o mosquito Lutzomyia. Reservatórios nos cães e gambás. Esta espécie é muito provavelmente sinónima de L. infantum.
- Leishmaniose principalmente cutânea (organismos de virulência baixa):
- L. major: Norte de África, Médio Oriente e Ásia central. Transmitida por Phlebotomus. Reservatório em roedores.
- L. aethiopica: Existe na Etiópia e no Quénia. Transmitida por Phlebotomus. Reservatório nos Hyrax, espécies de pequenos mamíferos.
- L. tropica: Existe em países da costa Sul e Este do Mediterrâneo e no Médio Oriente. Transmitida por Phlebotomus. O reservatório é principalmente humano (antroponose), mas o Hyrax também foi incriminado em alguns foci.
- L. mexicana: América central, e Sul dos EUA (especialmente no Texas). Transmissão pelo Lutzomyia. O reservatório são os roedores.
- L. amazonensis: América do Sul. Transmissão pelo Lutzomyia. O reservatório são os roedores.
- Leishmaniose principalmente mucocutânea (virulência intermédia):
[editar] Progressão e sintomas
O resultado de uma infecção com leishmanias pode tomar dois cursos. Na maioria dos casos o sistema imunitário reage eficazmente pela produção de uma resposta citotóxica (resposta Th1) que destrói os macrófagos portadores de leishmanias. Nestes casos a infecção é controlada e os sintomas leves ou inexistentes, curando-se o doente ou desenvolvendo apenas manifestações cutâneas. No entanto, se o sistema imunitário escolher antes uma resposta (humoral ou Th2) com produção de anticorpos, não será eficaz a destruir as leishmanias que se escondem no interior dos macrófagos, fora do alcance dos anticorpos. Nestes casos a infecção progride para a leishmaniose visceral, uma doença grave, ou no caso das espécies menos virulentas, para manifestações mucocutâneas mais agressivas e crónicas. Naturalmente que um indivíduo imunodeprimido não reage com nenhuma resposta imunitária vigorosa, e estes, especialmente os doentes com SIDA/AIDS, desenvolvem progressões muito mais perigosas e rápidas com qualquer dos patogénios. Em Portugal, Espanha, Itália e França este grupo tem ultimamente formado uma percentagem grande dos doentes com formas de leishmaniose graves.
A leishmaniose visceral, também conhecida por kala-azar ou febre dumdum, tem um período de incubação de vários meses a vários anos. As leishmanias danificam os orgãos ricos em macrófagos, como o baço, o fígado, e a medula óssea. Caracteriza-se, na minoria de indivíduos que desenvolvem sintomas, por início insidioso de febre, tremores violentos, diarreia, suores, mal estar, fadiga, hepatoesplenomegália, anemia, leucopenia e por vezes manifestações cutâneas como úlceras e zonas de pele escura (denominado kala azar, "doença preta" em hindi e persa, ou "botão do oriente"), em adultos principalmente. Se não tratada, é mortal num período curto ou após danos crónicos durante alguns anos, especialmente em doentes com SIDA/AIDS.
A leishmaniose cutânea tem uma incubação de algumas semanas a alguns meses, após o que surgem sintomas como pápulas ulcerantes extremamente irritantes nas zonas picadas pelo mosquito, que progridem para crostas com líquido seroso. Há também escurecimento por hiperpigmentação da pele, com resolução das lesões em alguns meses com formação de cicatrizes inestéticas. A leishmaniose mucocutânea é semelhante mas com maiores e mais profundas lesões, que se estendem às mucosas da boca, nariz ou genitais.
[editar] Diagnóstico e tratamento
O diagnóstico é pela observação directa microscópica dos parasitas em amostras de linfa, sanguíneas ou de biopsias de baço, após cultura ou por detecção do seu DNA ou através de testes imunológicos, como o teste de aglutinação directa.
O tratamento é por administração de compostos antimóniais, pentamidina, anfotericina ou miltefosina. A prevenção é por redes ou repelentes de insectos, construção de moradias humanas a distância superior a 500 metros da mata silvestre e pela erradicação dos Phlebotomus/Lutzomyia.
[editar] Vacina terapêutica para a leishmaniose
Uma vacina está sendo testada nos municípios de Caratinga e Varzelândia, em Minas Gerais, e também na Colômbia e no Equador, sob a coordenação da OMS. Os testes estão em fase final e, até agora, os resultados são bons e o pesquisador está otimista também com os resultados dos testes da vacina preventiva.
A Vacina Terapêutica para Leishmaniose, desenvolvida pelo Prof. Wilson Mayrink, pesquisador do Departamento de Parasitologia da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), recebeu o registro do Ministro da Saúde e, agora, pode ser comercializada no Brasil.
A cura da doença foi descoberta, no início do século XX, pelo médico paraense, de Belém do Pará, Gaspar Viana.