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Percival Farquhar

Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre.

Percival Farquhar (Iorque, 1864Nova Iorque, 4 de agosto de 1953) foi um empresário estadunidense, cuja presença na América Latina é alvo de constantes disputas.

Nascido numa abastada família quacre da Pensilvânia, completou seus estudos na Universidade de Yale, um dos centros da elite estadunidense, onde se formou em engenharia.

Foi vice-presidente da Atlantic Coast Electric Railway Co. e da Staten Island Electric Railway Co., que controlavam o serviço de bondes em Nova Iorque. Foi também sócio e diretor da Companhia de Electricidade de Cuba e sócio e vice-presidente da Guatemala Railway.

Explorou negócios em Cuba e na América Central. Teve ferrovias e minas na Rússia e negociou pessoalmente com Lenin.

Índice

[editar] Visionário e polêmico

Seu sonho era dominar o sistema ferroviário em toda a América Latina. Provavelmente era adepto da teoria do Destino Manifesto.

Visionário, controvertido, audacioso e polêmico, Farquhar tornou-se o maior investidor privado do Brasil entre 1905 e 1918. Segundo o escritor e ex-ministro Ronaldo Costa Couto, seu império só rivalizou com o do Conde Francisco Matarazzo e com o de Irineu Evangelista de Souza, o Visconde de Mauá

Sua historiografia é repleta de contradições, o que torna muito difícil expurgar de sua verdadeira história todas as lendas, louvações e libelos ali contidos.

O professor Francisco Foot Hardman [1] em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, declara:

Não dá para dizer que Farquhar era um satanás, mas também não podemos adotar um postura apologética, tornando-o um grande ícone do empreendedorismo...Ele era um exemplo típico do velho capitalismo internacional. [2]

O livro que exalta seus feitos - com algumas passagens que beiram à hagiografia [3] - é O Último Titã - Um Empreendedor Americano na América Latina [4] - uma dissertação feita por Charles A. Gauld para a Universidade de Stanford, sob a supervisão do professor Ronald Hilton [5].

A Revista Exame [6], fazendo uma resenha desse livro, assim se manifestou:

Embora exagere na admiração ao personagem, tratando-o sempre como um capitalista iluminado e cheio de boas intenções, Charles Gauld apoiou-se numa extraordinária riqueza de documentos e fontes de informações....

Por outro lado, o respeitado historiador brasileiro Edgard Carone, em seu livro A República Velha [7] diz que as empresas de Farquhar:

viviam de favores governamentais.

No livro Chatô - O Rei do Brasil [8], Farquhar é descrito pelo jornalista Fernando Morais como:

dono da Rio Light, da Companhia Telefônica Brasileira e de um grande número de ferrovias no Brasil, de estradas de ferro na Rússia e minas de carvão na Europa Central, além de engenhos de açúcar em Cuba.

É certo que criou e dirigiu inúmeros negócios na região latino-americana, incontáveis deles no Brasil. Suas atividades estavam freqüentemente ligadas a concessões governamentais e privilégios - e a garantias de juros governamentais para o capítal investido - que obtinha habilmente junto aos jovens e inexperientes governos locais, muitas vezes mediante espórtulas constrangedoras.

Destemido e arrojado financista, com grande trânsito pelo mercado de capitais da Europa, dizia-se

capaz de financiar qualquer coisa. Segundo Gauld, Farquhar teve mais fome de terras do que qualquer personagem da história da América Latina desde o tempo dos incas [9].

O início da Primeira Guerra Mundial, em 1914, interrompeu sua fonte de recursos a financiamentos e o já precário império de Farquhar - que fora criado a poder de contrair dívidas sobre dívidas - altamente endividado, desmoronou-se. Suas empresas entraram em concordata em outubro de 1914. Seus financiadores perderam todo o capital investido. Farquhar acabou arruinado. Apesar disso, ainda assim se re-ergueria novamente, após o término da guerra - usando as mesmas táticas - para tornar a quebrar na crise de 1929. Após a revolução de 1930 viu seus espaços contidos, durante o governo Getúlio Vargas, e assim terminou por deixar o Brasil.

Embora a dimensão e a extensão de sua atividade econômica possam impressionar favoravelmente os menos atentos, graças às altas somas de dinheiro envolvidas, e às febris atividades - aparentemente benéficas - que desenvolveu, um exame mais acurado dos empreendimentos que Percival Farquhar liderou no Brasil revela que, por onde passou, deixou um rastro de milhares de nativos mortos, destruições ecológicas de estados inteiros [10], estradas de ferro abandonadas sem qualquer manutenção, falências e bancarrotas, e até mesmo guerras civis.

Charles A. Gauld [11] escreve:

O gênio de Farquhar estaria mais do lado da visão e da capacidade de levantar dinheiro para expandí-las do que da administração eficiente e da economia de custos nas suas 38 empresas (p.301).

Ávido especulador, especulou fortemente com os papéis de suas próprias empresas. No início de 1913 Farquhar ficou sabendo que estava arruinado.

Farquhar tinha uma grande facilidade para se indispor com governantes e grupos nacionalistas. Mas as antipatias que provocava não eram totalmente sem fundamentos. [12]

Muito empenhado e hábil na autopromoção de sua imagem, sempre se esforçou para fazer a imprensa mostrar suas ações como sendo exemplo de um capitalista norte-americano altamente bem sucedido, um verdadeiro ícone do empreendedorismo estadunidense, razão pela qual deixou alguns admiradores.

Dentre esses destaca-se Assis Chateaubriand, Rei do Brasil, que se tornou o dono da maior rede jornalística do país. Essa amizade muito contribuiu para a ampla repercussão favorável de suas atividades. (Assis Chateaubriand tornou-se o proprietário do O Jornal, em 1924, comprando-o com dinheiro fornecido por Farquhar, alegadamente a título de pagamento de honorários advocatícios.)

[editar] Progresso sim, mas com mordomias

Percival Farquhar acreditava que nenhum país do mundo poderia se desenvolver adequadamente sem contar com bons hotéis e cozinheiros refinados.

Para suprir essas lacunas no Brasil do ínicio do século XX, construiu em São Paulo a elegante Rotisserie Sportsman e importou, do famoso Elisée Palace Hotel de Paris, o chef Henri Galon, narra-nos Fernando de Morais, em seu livro Chatô - O Rei do Brasil [13].

[editar] Grand Hôtel de la Plage

Adquiriu em 1911 da firma Prado, Chaves & Cia. o controle da Companhia Balneária de Santo Amaro, empresa fundada em 1892 que, sob a liderança do Conselheiro Antonio Prado fora criada para organizar um conjunto turístico e balneário onde hoje fica o centro do Guarujá. A nova empresa de Farquhar passou a se denominar Companhia Guarujá.

Logo encomendou ao escritório técnico Ramos de Azevedo a construção de um hotel de grandes proporções a ser erguido no local onde funcionara, até 1910, o Grand Hôtel de la Plage, construído no final do século XIX por Elias Fausto Pacheco Jordão, gerente e engenheiro do grupo Prado, Chaves.

Inaugurou, em 1912, o novo Grand Hôtel de la Plage que era composto por quatro grandes edifícios, de três e quatro andares servidos por elevadores, contando com 220 apartamentos, muitos deles com terraço, de onde se desfrutava uma bela vista para o mar. Novidade para a época: todos os apartamentos dispunham de aparelhos telefônicos.

Havia um pavilhão para banhistas, com 100 cabines, um local para o exercício de ginástica suéca, duas piscinas de água doce, dois parques junto às áreas ainda florestadas, além de um jardim zoológico.

[editar] Um "pirata" da finança internacional?

Farquhar veio ao Brasil no início do século XX, logo após a primeira grande moratória da dívida externa de nosso país, renegociada com a Família Rothschild, após a assinatura do Tratado de Petrópolis, de anexação do Acre ao Brasil.

Sua chegada ao Brasil pode não ter sido um mero acidente. É provável que sua vinda tenha sido relacionada ao distrato com o Bolivian Syndicate e ao compromisso assumido pelo governo brasileiro de construir a Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Farquhar logo se cercou de amigos importantes, como Alexandre Mackenzie e Ruy Barbosa, e usou um intermediário brasileiro para a compra da concessão de construção da Madeira-Mamoré – Joaquim Catrambi -, o qual operou como seu testa de ferro. Catrambi obteve junto ao Governo Rodrigues Alves a concessão para a construção da ferrovia em 1906 e no ano seguinte repassou-a à empresa de Farqhuar, a Madeira-Mamoré Railway Company, fundada em Boston (EUA), em agosto de 1907.

H.A. Bromberger [14], um jornalista francês, descreve Farquhar como sendo o resposável por:

esse empreendimento obscuro e assombroso, anárquico e absurdo, (que) possui o poder precioso, por si mesmo, de emitir em quantidade prodigiosa títulos sobre títulos, ações sobre ações, obrigações sobre obrigações. (...) a Brazil Railway Company aparece-nos como o empreendimento o mais temerário que tenha jamais saído dum cérebro yankee... [15]

Já Ivan Alves [16] relembra que os críticos descreviam Farquhar como:

“um pirata da finança internacional, empregado ou diretor de empresas norte-americanas... caixeiro viajante da finança internacional... Sua tentacular Brazil Railway Company controlava toda a rede ferroviária gaúcha, geria a Sorocabana, tinha interesses na Paulista, na Mogiana...obteve os direitos da Vitória Minas Gerais...passou a dirigir o Port of Para e a Companhia do Porto do Rio Grande do Sul...onde montou armazens frigoríficos, como no Rio de Janeiro. Afora isso, dispunha ainda de indústrias de papel, empresas pecuárias e de colonização, madeireiras, etc.

Controlador da Brazil Railway Company e da Southern Brazil Lumber and Colonization Co., cujas atividades de extrativismo florestal, entre outros danos, acabaram provocando a Guerra do Contestado - na qual morreram mais de dez mil brasileiros - exterminou a flora e a fauna em grandes áreas dos estados do Paraná e de Santa Catarina [17].

Foi também o construtor da Madeira-Mamoré, cujas obras foram inteiramente pagas pelo governo brasileiro. Sua construção, iniciada em 1907 - para ligar Santo Antonio do Rio Madeira a Guajará-Mirim - com extensão de 362 km - foi concluída em 1 de agosto de 1912. Pelo serviço executado na Ferrovia do Diabo, o truste de Percival Farquhar pleiteou, do Tesouro Nacional brasileiro, um pagamento em dinheiro de 102 mil contos de réis, equivalente na época ao valor de 50 toneladas de ouro.

[editar] A Madeira-Mamoré Railway Company

Do ponto de vista exclusivamente financeiro a ferrovia Madeira-Mamoré foi um grande sucesso para Farquhar. Na realidade, apesar da ferrovia registrar deficits operacionais durante quase todos os anos em que esteve em operação, foi com os lucros ali obtidos - graças aos termos favoráveis do contrato que tinha assinado com o governo brasileiro - que Farquhar começou construção de seu império particular – o Sindicato Farquhar.

A conta final que Farquhar apresentou ao governo brasileiro pela construção da ferrovia teve um aumento de 62 mil contos de réis - sobre os 40 mil contos de réis inicialmente orçados e já pagos. O acréscimo pleiteado foi considerado escandaloso. Depois de muita discussão, o governo concordou em pagar mais 22 mil contos, o que representava um reajuste de 55% sobre o contrato original, e encerrou a questão. Farquhar nunca se conformou com essa "derrota".

Os banqueiros e investidores ingleses e norte-americanos que proveram seu financiamento também auferiram bons rendimentos. As indústrias exportadoras dos países industrializados se beneficiaram com as encomendas de equipamentos e material ferroviário.

Já do ponto de vista exclusivamente do Brasil, o quadro não foi tão animador. Foram os trabalhadores na construção da Ferrovia do Diabo os maiores perdedores, milhares deles perdendo sua própria vida. Sua rotina de trabalho foi marcada por salários miseráveis, regime de trabalho semi-escravo, doenças e mortes em grande escala.

Para os contribuintes brasileiros que, com seus impostos, pagaram totalmente a fatura da construção, nada sobrou, nem mesmo uma ferrovia. Na década de 1930, os arrendatários da Madeira-Mamoré, já desinteressados do negócio, romperam unilateralmente o contrato de exploração da ferrovia e a devolveram ao Governo, praticamente sucateada. Em 1970 a ferrovia foi completamente desativada e seus arquivos foram destruídos.

[editar] A Ferrovia do Contestado

O engenheiro João Teixeira Soares projetou, em 1887, o traçado de uma estrada-de-ferro entre Itararé (SP) e Santa Maria (RS), com 1.403 km de extensão, para ligar as então províncias de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul pelo interior, o que permitiria a conexão, por ferrovia, do Rio de Janeiro à Argentina e ao Uruguai [18].

Em 9 de novembro de 1889, poucos dias antes da proclamação da república, D. Pedro II outorgou a concessão dessa estrada-de-ferro a Texeira Soares.

Sua construção teve início em 1897, no sentido norte-sul, tendo o trecho de 264 km entre Itararé e Rio Iguaçu (em Porto União) sido concluído em 1905

Em 1908 Percival Farquhar, através de sua holding Brazil Railway Company, adquiriu o controle da Companhia de Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande - EFSPRG. Antevendo o enorme potencial de lucro que poderia obter com a exportação de madeira das densas florestas centenárias de araucária existentes na região (havia imbuias com mais de 10 metros de circunferência) - em terras que viria a receber como doação do governo federal, nos termos do contrato de concessão da ferrovia - já fundara, anteriormente, a Southern Brazil Lumber & Colonization Company, que se tornou conhecida como a Lumber.

Farquhar incumbiu o engenheiro Achilles Stenghel de chefiar o ousado empreedimento. Este mandou recrutar, nas principais cidades brasileiras e até no exterior 4.000 operários - mediante a oferta de altos salários e boas condições de trabalho - para aumentar o contigente de mão de obra, que chegou a atingir 8.000 trabalhadores, distribuídos ao longo de 372 km da ferrovia.

O trecho de Porto União a Taquaral Liso foi inaugurado em 3 de abril de 1909 pelo presidente Afonso Pena.

A estrada-de-ferro foi solenemente inaugurada em 17 de dezembro de 1910. Uma enchente ocorrida em maio de 1911 derrubou a ponte provisória, de madeira, sobre o Rio Uruguai, interrompendo seu tráfego, que só voltou a ser totalmente restabelecido quando da instalação, em 1912, da ponte de aço que se encontra em serviço até hoje.

O engenheiro Achilles Stenghel correspondeu às expectativas de Farquhar: construindo a estrada-de-ferro praticamente a poder de pás e picaretas, sem dipor de maquinários, fez a construção da ferrovia avançar a um ritmo alucinante de 516 metros por dia.

A União garantiu, por contrato, à Brazil Railway Company uma subvenção de 30 contos de réis por quilometro construído e, ainda mais, garantiu juros de 6% a.a sobre todo o capital que fosse investido pela concessionária na obra. Como a Brazil Railway Company, contratualmente, recebia por quilometro, cuidou de alongar ao máximo a linha, fazendo curvas desnecessárias e economizando assim em aterros, pontes, viadutos e túneis.

Além da subvenção que recebia pela construção da ferrovia, a Brazil Railway Company recebeu também a propriedade das terras que ficavam até 15 km de cada lado da linha, o que representou uma doação, contratual, do governo brasileiro de 15.894 km² de terras fertilíssimas, cobertas de araucárias, numa área de 656.776 alqueires.(Deve-se lembrar que quanto mais curvas fizesse a ferrovia, maior área teriam as terras, a 15 km de cada lado da linha, que receberia a concessionária do governo brasileiro).

Essas terras foram oficialmente consideradas, pelo governo e pela concessionária, como sendo terras devolutas e desabitadas. A realidade dos fatos era, entretanto, bem outra. Seu povoamento tivera início já no século XVIII, com o comércio de gado entre o Rio Grande do Sul e São Paulo, quando ali surgiram os primeiros locais de pouso.

Durante muito tempo os milhares de habitantes desses longínquos rincões viveram, semi-isolados, da criação extensiva de gado, da coleta de erva mate e da extração rudimentar de madeira para seu próprio consumo. A erva mate podia ser vendida na região do rio da Prata.[19]

Se por um lado não se poderá isentar, totalmente, Farquhar na culpa pelos trágicos episódios que vieram a suceder na região do Contestado - como veremos adiante - por outro lado o governo federal, ao doar à Brazil Railway Company - mediante um contrato de concessão de serviços públicos - terras que eram ocupadas há séculos por brasileiros como se fossem terra de ninguém, destacou-se como o principal causador dos graves conflitos ali ocorridos.

Enquanto houve emprego disponível na construção da ferrovia não ocorreram maiores problemas. Ao término das obras, a Brazil Railway Company, por razões que se desconhece, não cumpriu seu compromisso de pagar a viagem de volta às suas cidades de origem para os 4.000 operários que arregimentara Brasil afora. Esses, desempregados, e sem meios para retornar a seus lares, juntaram-se aos demais nativos que foram demitidos da obra e começaram a perambular pela região, carentes de meios de subsistência. Foi lançada aí a primeira semente do que acabaria se tornando a Guerra do Contestado.

Ver artigo principal: Guerra do Contestado.

Todo o complexo da Brazil Railway Company acabou sendo dominado pela corrupção, indo à concordata em 1917. Em 1940 o governo Getúlio Vargas encampou todos os bens da Brazil Railway Company, incorporando o acervo da ferrovia à RVPSC - Rede Viação Paraná-Santa Catarina. Esta, por sua vez, foi incorporada à RFFSA - Rede Ferroviária Federal S/A em 1957.

[editar] Southern Brazil Lumber & Colonization Company

Terminadas as obras da estrada de ferro São Paulo-Rio Grande, Farquhar se dedica à segunda etapa de seu grande plano. Construiu um ramal ferroviário ligando Porto União à cidade de Três Barras, SC onde instalou, em 1913, a sede da Lumber, para explorar a madeira das matas ao redor da ferrovia.

A Lumber tranformou-se na maior serraria da América Latina e suas dimensões, mesmo nos padrões de hoje, são consideradas gigantescas .

A indústria madeireira ocupava uma área de 60 hectares e empregou 800 operários na sua fase inicial, número que chegaria dobrar. O complexo madeireiro se transformou em uma verdadeira cidade, com 214 casas para os empregados superiores, que dispunham de água encanada, energia elétrica, aquecimento central e água quente, proveniente das caldeiras que moviam a serraria. Até uma fábrica de gelo foi ali instalada. versão dos operários. Utilizou o 3º projetor cinematográfico trazido para o Brasil, o único ao sul de São Paulo.

A Lumber de Três Barras constituía um mundo à parte nesse país. Era muito bem guardada por pistoleiros armados até os dentes, trazidos dos Estados Unidos, e que tinham ordem para atirar nos operários descontentes [20].

Possuia quadras de tênis para uso exclusivo dos diretores e de seus filhos. Na empresa a bandeira brasileira quase nunca era hasteada. Todo dia 4 de julho, data da independência dos Estados Unidos o feriado americano era comemorado com toda a pompa e circunstância.

No museu da cidade de Três Pontas ainda se pode ver um filme mudo, produzido na década de 20, que mostra uma visita de Farquhar à cidade. Idoso e simpático, já a caminho da falência, cumprimenta seus funcionários e sorri.[21]

O site oficial do Município de Três Barras, SC [22] assim descreve a ação da Lumber em sua região:

A ação da empresa foi devastadora: toda a madeira extraída dos 180.000ha das terras do município foi vendida para a fabricação de casas nos Estados Unidos...
O progresso, porém, custou caro: a Lumber tinha suas próprias leis e funcionava como um território norte-americano dentro do Brasil. Pistoleiros vindos dos Estados Unidos tinham ordem de atirar nos empregados descontentes. Em 1938, Getúlio Vargas estatizou a madeireira, que tinha desviado 2.000.000 de libras esterlinas e pedira concordata. Cerca de 1.800 trabalhadores ficaram desempregados. [23]

[editar] Sorocabana Railway Company

Em 1906, em sociedade com o banqueiro francês H. Legru, Farquhar arrendou do governo do estado de São Paulo as linhas que foram da Companhia União Sorocabana e Ituana, denominando a nova empresa Sorocabana Railway Company.

Lucrativa até 1912, sua situação começa se deteriorar gravemente no final dessa década.

A princípio Fraquhar conseguiu expandir e operar a rede da ferrovia, que chegou a contar em 1911 com 3.061 empregados, atingindo 4.767 em 1918 no último ano antes de ser encampada.

Em meados da década de 1910, entretanto, inúmeras reclamações dos usuários começaram a ser feitas pela imprensa e chegaram a repercutir na Câmara de Deputados Estaduais.

Em 1914, discursando no plenário da Câmara, o deputado estadual João Martins, apoiado por Campos Vergueiro, declarou possuir notas com informações suficientes para provar:

com dados oficiais, a incorreção dos diretores dessa companhia e a lesão enorme, a lesão injustificável que estaria sofrendo o estado de São Paulo com o arredamento da ferrovia à Sorocabana Railway Company.[24]

Finalmente o governo do estado de São Paulo, na gestão Altino Arantes, resolve encampar a Sorocabana Railway Company, no dia 9 de setembro de 1919, assumindo novamente sua gestão.

C. de Paula Souza, o inspetor geral da Sorocabana, nomeado pelo governo do estado para fazer um laudo de recebimento da ferrovia, assim descreveu a situação da operação em agosto de 1919:

os armazéns estavam repletos de mercadorias aguardando para serem despachadas, havia frequentes interrupções de tráfego devido ao mau estado de conservação das locomotivas, os trens ficavam parados nas estações por falta de água...o leito da ferrovia não oferecia segurança...(Companhia Sorocabana; 1920, p. 3-4)

[editar] Itabira Iron Ore Company

[editar] Introdução

Em 1904 foi inaugurada a Companhia Estrada de Ferro Vitória-Minas (CEFVM) ligando Cariacica a Alfredo Maia. Sua construção chamou a atenção de grupos inglêses para existência de imensas jazidas de ferro na região. Estes grupos adquiriram grandes áreas de terra na região de Itabira, MG e fundaram, em 1909, o Brazilian Hematite Syndicate. Adquiriram também a maioria das ações da estrada de ferro.

No ano seguinte, durante o XI Congresso Geológico e Mineralógico, realizado em Estocolmo, na Suécia, o mundo toma conhecimento dessas reservas, que têm alto teor de ferro e são estimadas em 2 bilhões de toneladas.

Em 1911 Percival Farquhar adquiriu o Brazilian Hematite Syndicate alterando seu nome para Itabira Iron Ore Company.

[editar] O Projeto

Farquhar pretendia extrair o minério de ferro de Itabira para exportá-lo - ao ritmo de cerca de 10 milhões de toneladas/ano - através de Santa Cruz, ES, onde construiria uma pequena usina siderúrgica (com capacidade de 150 mil toneladas/ano), capaz de produzir materiais siderúrgicos mais básicos tais como trilhos, perfis, chapas grossas e vigas.

Navios do Sindicato Farquhar levariam o minério de ferro aos países industrializados e retornariam carregados de carvão mineral, oriundo dos Estados Unidos e da Europa, suprindo assim a ausência desse insumo essencial no Brasil.

Esse ousado e gigantesco projeto, orçado em 80 milhões de dólares, obteve toda a simpatia do presidente da república Epitácio Pessoa, que assinou o famoso Contrato Itabira de 1920. Imediatamente Farquhar passaria a sofrer uma feroz oposição de Arthur Bernardes, presidente da província autônoma de Minas Gerais.

Ambos tinham visões conflitantes e irreconcilíáveis: Arthur Bernardes pretendia implantar na região um império siderúrgico, sonhando com uma nova Região do Ruhr em seu estado, enquanto as prioridades de Farquhar se concentravam na exportação do minério bruto e na atividade ferroviária e marítima relacionadas a seu transporte.

A partir de então as opiniões políticas, no Brasil todo, passaram a se polarizar entre essas duas alternativas. Grupos de tendências mais liberais, adeptos do laissez-faire defendiam, com veemência, o projeto de Farquhar enquanto grupos nacionalistas, entre os quais se incluiam os tenentes e os intelectuais, defendendiam ardorosamente a posição de Arthur Bernardes.

Os que apoiavam Farquhar alegavam que o consumo de aço no Brasil jamais justificaria a instalação de uma siderúrgica de grande porte. Além disso, diziam, sua construção seria impossível porque os países detentores dos capitais e das tecnologias necessárias para sua construção não tinham interesse algum em ajudar um país importador de aço a se tornar seu produtor.

Os que apoiavam a posição de Arthur Bernardes protestavam, clamavando que Minas não poderia repetir o mesmo erro cometido 200 anos antes, quando todo o ouro que ali havia foi levado embora pelos portuguêses, restando para Minas Gerais apenas os buracos.

Farquhar colocou-se assim, deliberadamente, no fulcro de uma calorosa e violenta polêmica nacional, que duraria até 1941 e que certamente lhe rendeu muitos inimigos.

[editar] Os percalços

Farquhar sofre seu primeiro tropeço quando Arthur Bernardes se torna presidente da república, em 1922, e promulga uma lei que taxava em 3 mil réis por tonelada o minério de ferro que fosse exportado em bruto, inviabilizando assim o negócio.

Em 1930 Getúlio Vargas, de forte discurso e tendência nacionalista, contando com o apoio dos tenentes, assume o poder no Brasil à frente da revolução de 30.

[editar] A Encampação

Em 1935, o governo de Getúlio Vargas enfrenta os interesses da poderosa Itabira Iron Ore encampando a Estrada de Ferro Vitória a Minas.

Em 1937, é outorgada uma nova constituição para o Estado Novo, determinando que a exploração das jazidas minerais no Brasil passe a depender de prévia concessão do governo federal, a qual só poderá ser outorgada a empresas brasileiras, cujos acionistas sejam brasileiros.

Em 1941 Farquhar, vendo sua margem de manobra cada vez mais tolhida por Getúlio Vargas, resolve associar-se a empresários brasileiros e divide a Itabira Iron Ore em duas empresas "brasileiras": a Companhia Brasileira de Mineração e Siderurgia e a Companhia Itabira de Mineração.

Esse expediente tardio não surtiu o resultado imaginado por Farquhar.

Negociando habilmente com o governo americano - que precisava sua autorização para operar aviões militares nas bases aéreas do nordeste brasileiro, durante a 2ª Guerra Mundial, Getúlio Vargas conseguiu obter o beneplácito americano para a construção de uma siderúrgica de grande porte no Brasil - que se tornaria a Companhia Siderúrgica Nacional - CSN e, mais ainda, conseguiu fazer com que os americanos intercedessem junto ao governo inglês no sentido de evitar quaisquer objeções à encampação das reservas de minério de ferro ainda em poder de Farquhar.

Estes entendimentos foram denominados os Acordos de Washington [25], em decorrência dos quais Getúlio Vargas assina o decreto-lei nº 4.352 de 1º de junho de 1942 criando a Companhia Vale do Rio Doce. A nova empresa, constituída como uma sociedade anônima de economia mista, encampa as empresas de Farquhar e assume o controle da Estrada de Ferro Vitória a Minas, com o objetivo assegurar o suprimento estratégico de minério de ferro para a recém-criada Companhia Siderúrgica Nacional - CSN, bem como para dedicar-se à exportação de minério de ferro.

À guisa de curiosidade: a foto tirada na fundação da Companhia Vale do Rio Doce mostra Getúlio, ao assinar a ata, tendo de um lado o embaixador americano e de outro o embaixador inglês.

[editar] Bibliografia

  • GAULD, Charles. Farquhar, o último titã: um empreendedor americano na América Latina. São Paulo: Editora de Cultura, 2006. Tradução Eliana do Vale.
  • FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder, volume 2. Ed. Globo: São Paulo, 1998 (13ª edição)
  • FERREIRA, Manoel Rodrigues. A Ferrovia do Diabo. Ed. Melhoramentos: São Paulo, 1959 e 2005.

[editar] Referências

[editar] Na Bibliografia

  • ^ ALVES Ivan. O Contestado. Estados, posseiros, companhias – todos brigam pela terra. Coleção Os grandes enigmas de nossa história. Otto Pierre Editores: Rio de Janeiro,1982
  • ^ ARAÚJO NETO, Adalberto Coutinho de. A experiência sindical dos ferroviários da E. F. Sorocabana nos anos 1930.Tese de Mestrado, Departamento de História da Faculdade de Letras, Filosofia e Ciências Humanas da USP, São Paulo, 2006
  • ^ ((fr))BROMBERGER, H. A. Les chemins de fer exotiques.... Paris, édition du Moniteur économique et financier, 1913
  • ^ CARONE, Edgar. A República Velha. Editora Bertrand Brasil: São Paulo, 1ª Edição.
  • ^ GASPARI, Hélio. Grande retrato do rei da privataria Folha de S. Paulo: São Paulo, 9 de Agosto de 2006.
  • ^ ^ GAULD, Charles. FARQUHAR - O Último Titã - Um Empreendedor Americano na América Latina. Editora de Cultura: São Paulo, 2006
  • ^  HARDMAN, Francisco Foot é professor na Universidade Estadual de Campinas e autor do livro Trem Fantasma - Ferrovia Madeira-Mamoré e a modernidade na selva. Cia das Letras: São Paulo, 2004, 2ª Ed.
  • ^  HILTON, Ronald, Prof. é um Fellow do Hoover Institute na Universidade de Stanford e Chairman da World Association of International Studies.
  • MACHADO, Paulo Pinheiro. Lideranças do Contestado. Editora Unicamp / FAPESP
  • ^ HIRST, Mônica. História da Diplomacia Brasileira - A Era Vargas, Ministério das Relações Exteriores.
  • ^ MOLINA, Matías M. O magnata que se tornou mito. Revista Exame, Editora Abril: São Paulo, 02.11.2006
  • ^ ^  MORAIS, Fernando. Chatô - O Rei do Brasil. Cia das Letras: São Paulo, 1994, 13ª edição
  • ^ Os caçadores de concessões no Brasil e o fantasma de Percival Farquhar; Ceci Vieira Juruá
  • ^  TEICH, Daniel Hessel. Percival Farquhar, o internacionalista - Milionário americano negociava até com Lenin, o líder da Revolução Russa. in O Estado de S. Paulo, Caderno de Economia p. B9, Três Barras - SC, 6 de Março de 2005.
  • ^  ^ TEICH, Daniel Hessel. 50 Milhões de Árvores nos Vagões da ferrovia - Maior serraria da America do Sul derrubou grande parte da floresta de araucárias. in O Estado de S. Paulo, Caderno de Economia p. B9, Três Barras - SC, 6 de Março de 2005.

[editar] Ligações externas

[editar] Notas

^ Hagiografia: biografia ou estudo sobre biografia de santos. Por extensão de sentido, biografia excessivamente elogiosa.


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