Biografia
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Biografia (grego: βιογραφία , de βíος - bíos, vida e γραφή – gráphein, escrever) é um gênero literário em que o autor historia a vida e, não raro, aspectos da obra de determinada ou de várias pessoas, como Plutarco, em suas Bíoi parálleloi (Vidas paralelas), abordando-os muitas vezes de um ponto de vista crítico e não apenas historiográfico. O francês biographie é documentado em 1721; o inglês biography em 1791 e na forma biographia já em 1683; o espanhol biografía e português biografia somente na segunda metade do século XIX.
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[editar] Biografia
Baseado na obra de Plutarco Bíoi parálleloi, que fixa algumas diretrizes básicas do gênero, que o mundo ocidental passa a conhecer figuras como Péricles, Licurgo, Alcibíades, Temístocles, Júlio César, Pompeu, Catão de Útica, Marcus Junius Brutus e tantos outros. A biografia trata, na maioria das vezes, de pessoas públicas como políticos, cientistas, esportistas, escritores ou pessoas, que através de suas atividades deixaram uma importante contribuição para a sociedade. Quando o biografado (pessoa que está tendo a vida contada na biografia) é o próprio autor, chama-se autobiografia.
[editar] Antigo Oriente
Não se tem notícia de que o antigo Oriente houvesse conhecido este gênero biográfico, ao menos na maneira como ela é conhecida hoje em dia. As crônicas sobre os assírios e outros povos, bem como algumas inscrições em túmulos com dados referentes à existência dos mesmos, contêm, sem dúvida, semente do gênero, mas não constituem verdadeiros documentos biográficos. O mesmo ocorre no Egito, onde se registram vestígios biográficos sobre faraós, sacerdotes e outros personagens ilustres. As fontes mais remotas da arte da biografia devem ser buscadas no patrimônio documental e lendário que nos deixaram os relatos sobre episódios e acontecimentos comuns à vida dos patriarcas e reis de Israel (Antigo Testamento) e dos heróis épicos das antigas sagas gregas, germânicas e célticas.
Outro tipo de biografia, embora ainda de natureza embrionária, surge dos ensinamentos de santos e sábios, encontrados nos livros proféticos da Bíblia, das sentenças e ditos de Buda, dos fragmentos antológicos de Confúcio e das palavras dos Sete Sábios da Grécia antiga, conservadas pela tradição doxográfica. Muitos exemplos também oferece a literatura medo-persa, com suas crônicas de reis. Na literatura islâmica há um surpreendente perfil biográfico de Maomé, de autor desconhecido, além de esboços já mais elaborados de vidas de califas, sultões, ministros, cientistas, escritores e religiosos do complexo mosaico da cultura muçulmana. Na Índia, onde os admiradores do gênero sempre juntaram o dado histórico às tradições mitológicas, são inúmeras as tentativas de perfis biográficos de alguns sultões mongóis que dominaram a região, em especial de Akbar.
China e Japão tampouco chegaram a definir com clareza as características do gênero biográfico. Na China, ele permaneceu restrito às informações de comentaristas e historiógrafos como Tso Ch’iu-ming, Kungyang e Kuliang, cujos ideais tradicionalistas ilustram o Livro da primavera e do outono. O conceito de biografia será apenas ampliado pelo grande historiador Ssu-ma Ch’ien (145-86 aC), mas tampouco este ultrapassou os limites do estudo monográfico, de caráter coletivo. Outra manifestação biográfica típica do universo cultural sino-nipônico é o grande número de necrológios sobre figuras importantes.
[editar] Período Clássico
Os dois primeiros grandes biógrafos da civilização ocidental são, sem dúvida, Tácito e Plutarco. Antecipam-nos, contudo, Platão e Xenofonte. Aquele, com sua Apologia Sokrátou (Apologia de Sócrates), traça um retrato antes filosófico do que biográfico do grande pensador ateniense, mas Xenofonte, nas Apomnemonéumata Sokrátou (Memórias de Sócrates), oferece visão bem diversa, mais realística, de Sócrates, em sua intimidade e vida cotidiana. Em várias outras obras, aliás, Xenofonte continuaria a ser biógrafo, como em Anábasis, que relata um episódio de sua própria vida, e na Kyropaideia. Ainda na Grécia, não devem ser esquecidos os trabalhos biográficos de Aristóxeno de Tarento (para alguns o criador da biografia literária), Dicearco de Messina, Flávio Filóstrato e, sobretudo, Diógenes Laércio (este, porém, já em pleno século III dC., posterior, portanto, a Tácito e Plutarco).
Em Roma, onde o interesse pelo indivíduo humano sempre constituiu traço característico das obras de escritores e historiógrafos, destacam-se as contribuições precursoras de Áccio, Ático, Cornélio Nepos ou Nepote (De excellentibus ducibus; De historicis latinis - Sobre os historiadores romanos), Valério Probo, Públio Terêncio Varrão (De imaginibus – Retratos), com cerca de setecentas biografias de poetas gregos e romanos, em 15 volumes; De poetis – Sobre os poetas, Quinto Cúrcio (autor de uma vida de Alexandre o Grande) e, acima de todos, Suetônio, com um modelo de biografia literária, De viris illustribus (Sobre os homens ilustres), e outro, de biografia política, De vita Caesarum (As Vidas dos imperadores), famoso pelos detalhes sinistros ou escabrosos das vidas dos tiranos.
Freqüentemente considerada a primeira biografia enquanto tal, De vita et moribus Julii Agricolae (ou simplesmente Agrícola, como é mais conhecida), de Tácito, data do ano 98 da nossa era. Trata-se de um elogio às virtudes de seu sogro.
[editar] Idade Média
O acervo biográfico medieval é particularmente rico em vidas de santos, abades, heróis nacionais e senhores feudais (estes, aliás, encomendavam muitas vezes aos escribas da época que lhes redigissem a sua biografia ou a de seus antepassados ilustres). No domínio da hagiografia, a Antiguidade cristã deixou as numerosas Vitae sanctorum, às quais seguem, na Idade Média, os Actus beati Francisci, Vite dei santi padri, Gesta archi-episcoporum Mediolanensium, Gesta Berengarii imperatoris, Gesta episcoporum, Gesta abbatum e outras tantas coleções hagiográficas. No que diz respeito aos textos profanos: Vita Conradi II, de Wipone (século XI); Vita Caroli Magni, de Einhard (séculos VIII – IX); Vita Ludovici regis (trata-se de Luís VI o Gordo), de Abade Suger de Saint-Denis (século XII); Histoire de saint Louis, de Jean de Joinville (séculos XIII – XIV); Annales rerum gestarum Alfredi Magni, de Johan Asser (século X). A famosa Legenda Áurea (Lenda áurea), de Jacopo de Voragine ou Varagine (século XIII), é uma coleção hagiográfica.
Cabe ainda mencionar, ao fim do período medieval, as contribuições biográficas de Francesco Petrarca, com De viris illustribus, e de Giovanni Boccaccio, autor de De claris mulieribus (Sobre as famosas mulheres) e de De casibus virorum illustrium (Sobre a vida de homens ilustres), obras que, apesar de seu espírito medieval, já incluem preocupações humanistas, devendo por isso ser consideradas como obras de transição. De Boccaccio, aliás, é muito mais importante para a evolução deste gênero a sua Vita di Dante, também conhecida como Trattatello in laude di Dante, que, de certa forma, dá início aos modernos métodos de análise psicológica.
[editar] Renascimento
O interesse da mentalidade renascentista pela personalidade humana, individualmente caracterizada, criou coleções biográficas nacionais e dicionários biográficos tanto nacionais como universais, que depois se tornariam muito populares durante o século XIX e mesmo até hoje. Tais obras foram favorecidas pela invenção da imprensa e seu número atinge soma bibliográfica espantosa. Os perfis individuais são bem menos numerosos. Na Itália destaca-se a Vita di Torquato Tasso, de Giuseppe de Manso, além de uma outra de Galileu Galilei, escrita por Vicenzo Viviani.
Na Inglaterra, não podem ficar sem registro The History of King Richard the Third (1557), de Thomas More; Life of Cardinal Wolsey, de Thomas Cavendish, que permaneceu em manuscrito até 1641; e The Life of Sir Thomas More, de William Roper, escrita por volta de 1558 – 1560 e que constitui um dos maiores textos biográficos do período Tudor.
Em Portugal, finalmente, publicou-se a Crônica do condestável D. Nuno Álvares Pereira, atribuída a Fernão Lopes.
[editar] Idade Moderna
Dominado pelas teses estéticas do Barroco e do Classicismo, o século XVII não assinala exemplos particularmente significativos da evolução do gênero biográfico, menos na Inglaterra. Um primeiro grande passo foi dado por Isaak Walton, que introduziu diversas modificações na técnica do relato biográfico, passando inclusive a incorporar cartas como fonte de informações no próprio texto de suas obras. Entre 1640 e 1678, Walton escreveu magníficas biografias dos chamados metaphysical poets (Donne, Herbert, Hooker, Sanderson). Outro biógrafo de relevo é John Aubrey, autor de Brief lives (1669-1696; Biografias breves); somente publicadas em 1898.
Na França, porém, dominam as memórias: Mémoires (1662-1677; só publicadas em 1717), do cardeal de Retz. Mas Brantôme escreveu uma série de Biographies (1665) e Jacques de Thou publicou uma Historia mei temporis (1604-1620; História de minha época), de caráter nitidamente moralístico. No fim do século XVII, entra no gênero a crítica histórica, de caráter polêmico: exemplo dessa tendência é o Dictionnaire historique et critique (1694-1696), de Pierre Bayle, que exercerá influência decisiva sobre a crítica da religião no século XVIII.
Em Portugal, o primeiro modelo de uma biografia de espírito nacional é a Vida de D. João de Castro, de Jacinto Freire de Andrade.
O século XX marca o advento de uma modalidade do gênero até então desconhecida ou pouquíssimo cultivada: a biografia romanceada, na qual o autor recria, ficcionalmente, o material documental e de pesquisa coletado sobre a vida dos biografados. Os mestres dessa nova corrente, que deve muito a Strachey, são Stefan Zweig e Emil Ludwig, na Alemanha, e André Maurois e Romain Rolland, na França.
A literatura de língua portuguesa inclui alguns bons exemplos do gênero no século passado. Lúcio de Azevedo, autor de uma História do padre Antônio Vieira (1931, 2 volumes) e João Gaspar Simões, que responde por uma combatida mas fundamental Vida e obra de Fernando Pessoa (1950, 2 volumes).
No Brasil, o gênero biográfico teve ou tem seus melhores cultores em Joaquim Nabuco (Um Estadista do império - 1899); Lúcia Miguel Pereira (Machado de Assis, estudo crítico e biográfico – 1936; A Vida de Gonçalves Dias – 1943); Raimundo Magalhães Júnior (Machado de Assis desconhecido – 1955; Rui, o homem e o mito - 1965); Viana Moog (Eça de Queirós e o século XX – 1938).
[editar] Autobiografia
A autobiografia é quando o autor procede ao levantamento de sua própria existência. O gênero da autobiografia inclui manifestações literárias semelhantes, como confissões e cartas, que revelam sentimentos íntimos. Muitas pessoas proeminentes utilizam-se de um profissional (Ghostwriter) para desempenharem essa tarefa.
Fato curioso na cultura sino-nipônica da Antiguidade é o número elevado de autobiografias, todas, porém com poucas indicações biográficas e surpreendentemente farto material bibliográfico, traço esse mais característico das literaturas coreana e japonesa. Vale a pena citar, dentro do contexto literário da Antiguidade clássica, duas obras da natureza confessional ou apologética, espécie de autobiografias parciais: uma de índole filosófica, o Ta eis heautón, do imperador e pensador estóico Marco Aurélio; outras, de tendência política, os Commentarii, de Júlio César, que abrangem o De bello gallico e o De bello civili.
É no início da Idade Média que surge o primeiro grande modelo de obra autobiográfica, as Confessiones (Confissões) de santo Agostinho (século IV), que, por sua introspecção psicológica e antevisão existencialista, permanecem vivas até hoje, tendo exercido profunda influência sobre filósofos como Pascal e Kierkegaard ou escritores como Rousseau. Temos ainda Paulino de Pella (séculos IV – V), que escreveu Eucharisticos de vita sua.
A literatura italiana dá também um notável exemplo de autobiografia no Renascimento com a pouca fidedigna, mas vivíssima, Vita di Benvenuto Cellini, escrita pelo grande escultor em 1558, mas somente publicada quase dois séculos depois, em 1728.
A literatura russa dá notável exemplo de ensaio autobiográfico com a obra do arcipreste Avvakum, Zhitie protopopa Avvakuma (1673; Vida de protopopo Avvakum), em estilo vigoroso e realista. Na Inglaterra do século XVIII, Gibbon escreveria a melhor das autobiografias já lançadas até hoje em língua inglesa: Memoirs of my life and writings, publicadas por sua filha Marie Josephe em 1795.
A literatura norte-americana assinala sua contribuição para o gênero através da Autobiography (1766), de Benjamin Franklin. Na Itália, as autobiografias de Carlo Goldoni (Mémoires – 1787, escritas originalmente em francês) e a de Carlo Gozzi (Memorie inutili - 1797) são dignas de menção. A obra-prima do gênero autobiográfico são Les Conféssion (1781-1788), de Jean-Jacques Rousseau, que, filiado à linha intimista e subjetiva, se insurge contra a raison classicista e antecipa a mentalidade romântica do século XIX.
No Brasil, no plano autobiográfico um dos iniciadores foi Joaquim Nabuco com o clássico Minha Formação. No século passado , vale lembrar de Graciliano Ramos (Infância – 1945), Oswald de Andrade (Sob as ordens de mamãe – 1954), Helena Morley (Minha vida de menina – 1952), Afonso Arinos de Melo Franco (A Alma do Tempo, Formação e mocidade – 1961, A Escalada – 1952 e Planalto (1968)e Pedro Nava (Baú de ossos – 1972) com clara influência proustiana.
[editar] Bibliografia
- HISGAIL, Fani; Biografia Sintoma da Cultura; Hacker Editores; 1997; ISBN 8586179086.
- PENA, Felipe; Teoria da Biografia sem Fim; Mauad; 2004; ISBN 8574781320.